1 1ª edição | fevereiro 2021 ENTREVISTA SARA GOMES CRIANÇAS E JOVENS DISCUTEM OS LÍDERES DO AMANHÃ Resoluções do Ano Recomendações OUT Diários Achados 1ºcapítulo| Novela “Into the book” Revista de Animação Sociocultural Projeto Editorial de Expressão Escrita Presidente da PASEC 2 3 Notícias Notícias CRIANÇAS E JOVENS DISCUTEM OS LÍDERES DO AMANHÃ Teve lugar entre os dias 20 de dezembro de 2020 e 13 janeiro 2021 os principais mo- mentos de formação da Assembleia Interna- cional Juvenil 20.21 , organizada pela PASEC em parceria com organizações internacionais de juventude de Itália e Espanha e apoiada pelo Programa Erasmus + da União Europeia. Foram mais de trinta as atividades realizadas em três países em simultâneo (Itália, Portugal e Espanha). Adaptada aos atuais tempos de pan- demia COVID 19, as atividades foram realizadas por grupos de trabalho para evitar ajuntamentos e cumprindo as regras de saúde pública exigidas. As dezenas de ações tiveram um formato on- line e presencial a partir do tema integrador “Os Líderes do Amanhã” . O tema principal da AIJ. 20.21 foi “Habitamos nas Margens para além do Horizonte” , mas estes últimos dias fo- ram dedicados a descobrir as qualidades que as crianças e jovens têm de ter para enfrentar os desafios que ainda não foram inventados. Foi um dos principais pontos de reflexão que, numa fase em que exige aos cidadãos rápidas adap- tações, sacrifícios e que até se abdiquem de li- berdades que se consideravam como adquiri- das, é fundamental formar “as gerações futuras” sobre o compromisso com a Democracia, a Li- berdade e a Educação para a Cidadania Global. Tiveram lugar Masterclasses com espe- cialistas internacionais, realizaram-se vários Workshops Artísticos, Reflexões, Debates On- line, Sessões de Animação Desportiva, Es- petáculos Online e muitas mesas redondas. As atividades tiveram lugar em 7 ter- ritórios, 3 países e envolveram mais de oito centenas de crianças e jovens. No final foi aprovado uma declaração final intitulada “Preparar os Desafios que ainda não foram inventados...os Líderes do Amanhã...”. A Assembleia Internacional Juvenil continuará ainda durante o mês de janeiro e fevereiro de 2021 em formato online, integrando desta vez cinco países Portugal, Espanha, Itália, Hungria e Albânia. PASEC OUTRA VEZ PROJETO INSPIRADOR E BOA PRÁTICA DA UNIÃO EUROPEIA A PASEC é a única organização portuguesa a ser considerada por quatro vezes projeto inspi- rador da UE e por três vezes boa prática da UE. PASEC foi mais uma vez considerado Projeto Ins- pirador da União Europeia e Boa Prática da UE. É o sexto ano que isto sucede, sendo que a PASEC é a única organização portuguesa com este registo. A PASEC foi considerada projeto inspirador no âmbito do Corpo Europeu de Solidariedade, novo programa europeu que surgiu em 2018. A PASEC foi reconhecida no âmbito dos seus projetos de voluntariado europeu e internacio- nal junto de comunidades de risco. Como Boa Prática, este reconhecimento surgiu no âmbito do Programa Erasmus +. Foi reconhecido o mé- todo de ação e formação de Simbologia Gru- pal, desenvolvido pela PASEC. Nos últimos 24 meses este método foi replicado em Itália, Es- panha e Luxemburgo enquanto método de tra- balho cooperativo capaz de ser usado em sala aula e em contexto de educação não formal como forma de consolidar as competências so- ciais, o trabalho de interpares e projetos cultu- rais e sociais junto das comunidades de origem. Este ano, devido à Pandemia de COVID 19, os prémios foram divulgados através de sessões on- line através das Redes Sociais com a participação do Secretário de Estado da Juventude e Desporto, o Ministro da Ciência e Ensino Superior e os Dire- tores da Agência Erasmus + Desporto e Juventu- de e a Agência Erasmus + Educação e Formação. Neste âmbito, a Presidente da PASEC, Sara Go- mes salientou “que estes são dois prémios que muitos nos honram e que demonstram a exce- lência do trabalho de inovação social das equipas pedagógicas da PASEC”. Referiu ainda “que estes dois importantes galardões de alcance interna- cional são o resultado de um trabalho continu- ado e consolidado assente numa pedagogia de proximidade que coloca os jovens no centro do seu processo de desenvolvimento psicossocial”. Em 2020 a PASEC já tinha vencido o Prémio BPI La Caixa, um dos principais galardões nacionais no âmbito dos projetos de solidariedade social. PASEC ENTREGA PRÉMIOS MULTIPLICADORES 2020 E RECEBE PELA 3ª VEZ PRÉMIO BPI LA CAIXA A PASEC fez 18 anos e, mais uma vez, entre- gou os Prémios Multiplicadores, edição 2020, que destacaram jovens e agentes educativos que se distinguiram na promoção do Protagonismo Juvenil, Educação Não formal e Animação So- cioeducativa. O homenageado deste ano foi o Mestre Stefano Bottelli de Itália, pela divulgação da Animação Sociocultural em Itália e pelas de- zenas de projetos socioeducativos internacionais que coordenou nos últimos 20 anos. Os restan- tes prémios foram para: Sara Gomes, atual Presi- dente da PASEC e Técnica Superior de Educação; 4 5 Notícias Notícias Isabel Azevedo, Mestre em Psicologia e Anima- dora de Grupos Juvenis; Mariana Cardoso, aluna de Psicologia na Universidade Católica do Porto, Encenadora de Expressão Corporal e Animadora de Grupos Juvenis; Francisca Mendes, estudante de Educação na Universidade do Minho e Ani- madora de Grupos Juvenis; Daniela Carneiro, es- tudante de Criminologia pela Universidade do Minho e Animadora de Grupos Juvenis; e Maria João Leitão, aluna de Educação pela Universida- de do Minho e Animadora de Grupos Juvenis. Os prémios tiveram em consideração três fa- tores: currículo na área da promoção e envol- vimento em projetos de protagonismo juvenil; qualidades reveladas no trabalho de animação e dinamização de grupos juvenis; competências de mobilização, liderança e gestão reveladas em projetos de índole social, cultural ou comunitário. Para além disto, a PASEC recebeu pela 3ª vez o Prémio BPI La Caixa , desta vez na área da Infância. O BPI e a Fundação “la Caixa” lança- ram mais uma edição do Prémio Infância (integrado nos vários prémios sociais que atri- buem todos os anos), um prémio para apoiar projetos que facilitem o desenvolvimento inte- gral e a saúde de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, bem como o reforço de competências parentais. E foi neste domínio que, mais uma vez, a PASEC ficou classi- ficada como um dos vencedores da edição 2020. FEIRA DE JOGOS INTERCULTURAL 2020 JUNTA MAIS DE 360 JOVENS a realidade intercultural dos nossos dias. A atividade aconteceu em simultâneo nos Complexos de Habitação Social das Lamei- ras e Cal, no Pavilhão Municipal de Calen- dário, na Casa das Ideias da PASEC, no Cen- tro de Atividades Ocupacionais da AFPAD e noutras localizações da cidade no sentido de evitar ajuntamentos e permitir a participa- ção do máximo de jovens e crianças possível. O tema “As 4 Faces da Interculturalidade” pretendeu estabelecer um paralelo entre as várias formas de ver a realidade multicultu- ral e intercultural dos nossos dias. O Secretá- rio Geral da PASEC, Abraão Costa, referiu que “a feira deste ano pretendeu demonstrar, atra- vés do jogo simbólico, que um mesmo pro- blema tem muitas formas de ser interpreta- do e é sempre uma nova oportunidade de testar novas abordagens e formas de o resolver”. Este, segundo as palavras da Presidente da PA- SEC, Sara Gomes, “mais um momento que permitiu destacar a Educação Intercultural e o Diálogo Inter- cultural como um dos pilares da nossa sociedade” Esta iniciativa inicia a comemoração por par- te da PASEC dos seus 18 anos de vida e este- ve integrado no plano de ação do Projeto Eu- robairro, apoiado pelo Programa Escolhas do Alto Comissariado para as Migrações. Divididos por 23 postos diferentes por toda a cidade de Famalicão foram mais de 360 as crianças e jovens que participa- ram na Feira de Jogos Intercultural 2020. Respeitando as regras instituídas pelas Au- toridades de Saúde em tempos de Covid 19 foi possível, pela 20ª vez , dar corpo à Fei- ra de Jogos Intercultural 2020. Este ano o tema foi “As 4 Faces da Interculturalidade” Através de um jogo de cartas gigante pre- parado para efeito, e divididos por grupos de competição, os participantes puderam através do Teatro, Mímica, Desenho e Debate mostrar a forma como percebem, vivem e interpretam 6 7 RECOMENDAÇÕES OUT! Jesusalém: uma obra literária que nos dá as voltas á cabeça e que é tudo menos o tipo de romance “cliché” onde o casal perfeito acaba junto num final de contos de fadas. Se tivesse de escolher duas palavras para descrever este livro, muito provavelmente atribuiria “estra- nho” e “maturo”. Primeiro porque o livro só ga- nha sentido quando chegamos ao fim, até ler- mos a última palavra da última página; segundo porque não é qualquer um que consegue ler Uma história como esta, com todos os cenários controversos que a compõe, e perceber a mensagem principal e todas as suas entrelinhas. A narrativa conta a história de uma família, que após o suicídio da mãe, foge da vida citadina e vai morar para “Jesusalém”, uma cidade imaginária no meio do nada, que foi criada com o objetivo de fugir do passado, procurando uma nova identi- dade. Neste novo mundo o pai, Silvestre Vitalício, tenta criar os seus filhos, Mwanito e Ntunzi num mundo sem fantasmas, sem passado e sobretu- do sem mulheres. Apesar de afirmar que todo este mundo imaginário foi criado para proteger os seus filhos do mundo cruel, a verdade é que, depois do suicídio do suposto “amor da sua vida”, Vitalício tenta fugir do seu passado e de todas as mágoas que advém dele, criando um mundo onde apenas o silêncio e a falta de tempo curam. Toda esta narrativa e a história que a compõe descrevem, de uma forma muito evidente, um sentimento de dor muito presente na vida huma- na: a dor de sofrer e não conseguir esquecer esse sofrimento. Todos os sentimentos, de cada uma das personagens, acabam por se transformar em sentimentos nossos, à medida que lemos a his- tória. É como se mergulhássemos no livro e nos tornássemos numa personagem dele. E mesmo sem finais felizes ou contos de fadas, Mia Couto conseguiu construir um livro que toca no cora- ção do leitor e que se torna numa história tão pessoal com a qual facilmente nos identificamos. Admito que não seria a minha primeira esco- lha de leitura, assim à primeira vista, mas vos ga- ranto que no final, será uma ótima opção para os vossos tempos de leitura. Afinal, um pou- co de invulgaridade nunca fez mal a ninguém. O Vendedor de Passados de José Eduar- do Agualusa é uma história onde Eulálio, uma osga, nos narra as peripécias da vida de Fé- lix Ventura, o proprietário da casa onde Eu- lálio percorre livremente as suas paredes. Ação decorre em plena Guerra Civil Angolana na linda cidade de Luanda, cidade onde reside a nossa personagem principal. Félix é homem albi- no natural de Angola, que diz praticar uma for- ma evoluída de literatura, referindo-se à criação de passados ilustres para a emergente burgue- sia Angolana, justificando que contrariamente à literatura atual, ele não prende a sua criação a um livro, mas projeta-a para a realidade. Os seus clientes eram normalmente novos burgueses, ou seja, pessoas que tinham um futuro garan- tido, e que precisavam de um passado digno. Félix surge na obra como um solitário, rejei- tado pelas mulheres, passando grande parte do seu tempo a confidenciar com Eulálio (nome que Félix deu à osga). Contudo, no início da obra, Félix conhece Ângela Lúcia, uma fotógrafa, por quem ganha interesse. Eles acabam por se aproximar e por passar mais tempo juntos em casa de Félix. Mais tarde, em situação de confronto entre Felix, Ângela, Barata dos reis e Buchmann, Félix Ventura vê-se encurralado por um triângulo de violência e ódio, pois Buchmann, mais tarde, se apercebe que Barata tinha sido o homem que o prendeu e que matou a sua mulher e mutilou a sua filha, ainda bebé, mesmo em frente aos seus olhos. O ato final do conflito foi de Ânge- la Lúcia, que acaba por matar Barata dos Reis, e surge assim o terceiro vértice da pirâmide: esta era a filha de Buchmann. Os três acabam por enterrar o corpo do mendigo, e junto a ele, toda a situação, nunca mais falando do assun- to. Nesta obra, José Eduardo Agualusa é capaz de em poucas palavras ser muito detalhado. Dou pessoal importância à sua capacidade de utilizar a osga como símbolo da dualidade homem e animal, sendo que para além de ob- servar, também ela interage com Félix, e até mesmo tem vislumbres da sua anterior incar- nação como homem. Dando um carácter mais reflexivo à obra, fazendo-nos questionar so- bre o ser e também sobre como por vezes a li- nha entre a realidade e a imaginação se torna muito ténue quando lembramos o passado. Recomendo a sua leitura, pois podem acreditar que apesar de ter um enre- do relativamente simples, Eulálio tem mui- tas mais peripécias que acrescentam um enorme detalhe a esta emocionante obra. Jesusalém O Vendedor de Passados Texto da autoria de Margarida Moreira Texto da autoria de Telmo Pinheiro “Recomendações OUT!” é a secção da Animateca que sugere livros, filmes, sé- ries ou músicas. Nesta edição, trazemos três sugestões literárias. Jesusalém, O Vendedor de Passados e o Tatuador de Auschiwtz são os 3 livros destacados. RECOMENDAÇÕES OUT! 8 9 Uma história extraordinária e real, pu- blicada mais de setenta anos depois de tais eventos, que fala de um homem num dos piores momentos e lugares do mun- do: o campo de concentração de Auschwitz. Situado em abril de 1942, Lale encontra-se num comboio há 17 dias, sem tomar banho, co- mer ou dormir. As pessoas à sua volta estão cada vez mais nervosas, sem saber para onde vão, e com medo, tentando sobreviver. Aterrado, Lale coloca um sorriso sobre aqueles que olham para ele. Um mês depois de entrar no campo, Lale fica doente com tifo e é atirado para o camião de pes- soas doentes, onde são amontoados e deixados a morrer. Este acorda sete dias depois, ao lado de dois homens sem saber o que lhe tinha acon- tecido. Lale apercebe-se que o esconderam e cuidaram dele, colocando as suas próprias vi- das em risco, chegando à conclusão que, em- bora o ódio fosse muito poderoso naquele lugar, a bondade do ser humano poderia ilu- minar alguma esperança e só então o amor ti- nha a oportunidade de dominar o mundo. Felizmente ou infelizmente, Lale é ordenado a ser o tatuador do campo. Este não gostou da ideia pois fá-lo sentir mais que outros e fá-lo re- viver o seu primeiro dia. Algum tempo depois, Lale é obrigado a ir para as câmaras de gás e lim- pá-las. Entrar lá, com aquele cheiro e saber o que tinha acontecido, foi aterrador. Este percebeu na- quela noite que todos os seus novos amigos já não voltariam. Naquele dia, Lale só queria morrer. Um dia, como qualquer outro, chegava outro comboio com prisioneiros, quando Lale, sentado no seu sitio de trabalho, a viu. Não sabia porquê, mas apaixonara-se instantaneamente por aquela mulher. A necessidade de a ver de novo, de falar com ela e de a abraçar, trouxera Lale de volta à vida. O tatuador de Auschwitz é uma bela história de amor, dentro de algo tão mau e tão cruel como o ódio do ser humano. Nesta história, Lale demons- tra que dentro do seu próprio instinto de sobre- vivência podia tornar a vida um pouco mais fácil para os outros, voltando às origens mais simples e básicas. Este mostra-nos a capacidade de os seres humanos lutarem contra a adversidade, a injusti- ça e a dor, e assim provar que dentro de um dos piores lugares do mundo se pode lutar pelo bem. Como disse Victor Frankl: a salvação do ho- mem só é possível através do amor e no amor. Resoluções do Ano: - Evoluir/trabalhar na coesão grupal; - Procurar mais técnicas e estilos de dança diferentes; - Conseguir transmitir a ligação do grupo às pessoas que assistem; - Dedicar mais tempo ao grupo. ARENA IV CAVALEIROS JAGUAR - Realizar um momento de partilha para recordar os últimos 24 anos. - Abraçar; - Autoconhecimento; - Aproveitar ao máximo todos os momentos; O Tatuador de Auschwitz Texto da autoria de Carla Inocêncio “Resoluções do Ano” é a secção exclusiva desta edição da Animate- ca, onde 3 grupos da PASEC refletiram sobre aquilo que querem traba- lhar, enquanto grupo, ao longo do próximo ano e definiram os objetivos a atingir. RECOMENDAÇÕES OUT! Os Arena IV são um dos grupos que pertencem à Companhia de Dança e Expressão Corporal - ARENA. Os Cavaleiros foi o grupo pioneiro da PASEC, criado em 1996. Os Jaguar são um dos muitos grupos que foram surgindo a partir das intervenções no contexto escolar, e pertencem à PASEC IN GROUP. 10 11 En tre vis ta. Sara Gomes É a atual Presidente da PASEC - Plataforma de Animadores Sociodedu- cativos e Culturais. Está no seu segundo mandato e os desafios são cons- tantes. Falamos sobre o presente, passado e futuro e ficamos a conhecer melhor o seu percurso até aqui. De participante a líder, Sara Gomes é um dos melhores exemplo do aprendiz que se torna também ele num mestre. 12 13 Como foi o início do teu percurso dentro da PASEC? Tudo começou no grupo Cavaleiros quando eu tinha 16 anos. Na altura, o Abraão Costa, atual Secretário Geral da PASEC, era meu professor na escola e con- vidou-me para fazer parte da associa- ção de que ele fazia parte, a PASEC. Anos mais tarde, em 2012, comecei com o está gio profissional cá e, no final do estágio, surgiu a oportunidade, devido aos imen- sos projetos que estavam em cima da mesa, de ficar enquanto funcioná- ria, convite que prontamente aceitei. Como foi passar para animadora e, mais tarde, para Presidente? Quando passei para Presidente, foi algo muito natural pois era algo que estava mais ou menos “projetado”. Na base do nosso trabalho está tam- bém a criação de competências de lide- rança que nos permitam a possibilidade de assumir um cargo na direção, qual- quer que seja o lugar. Daí, não ter sido, de todo, uma surpresa ou algo para o qual não estivesse minimamente preparada. Quando passaste de voluntária para profissional na Animação? Na verdade, não senti qualquer tipo de diferença porque, enquanto voluntários, somos treinados para a responsabilidade, entre outras competências, de igual for- ma como os restantes animadores. Acho que a grande diferença foi nos responsá- veis que acabaram por me dar mais tare- fas e áreas, nas quais eu teria de intervir cada vez mais e de modo mais autónomo. Que funções tens enquanto Pre- sidente de uma associação juvenil que não estavas à espera? Penso que, em primeiro lugar, foi a adaptação que tivemos de criar para conseguir fazer frente aos vários con- textos/áreas da PASEC, com respos- tas cada vez concertadas e inovadoras. O desafio maior é a gestão das emo- ções, não só da minha equipa técnica, como também da PASEC no seu todo por- que quando estou a lidar com essas si- tuações tenho de me colocar no papel de Presidente/Coordenadora e não tanto no papel da Sara enquanto amiga, anima- dora, participante, o que, por vezes, é di- fícil de gerir, mas não impossível (risos). Quantos e que tipo de grupos geres e a quantas pessoas chegas por semana? Atualmente, sou animadora de dois gru- pos de crianças, doze grupos de ado- lescentes/jovens, em que quatro são em contexto escola. Para além disso ainda sou animadora de dois grupos de jovens com deficiência e um grupo de adultos. Em termos de coordenação faço a gestão de duas áreas da PASEC, nomeadamente, o Advantage e o Habitat e ainda auxílio na gestão da PASEC ADN. Chego semanalmen- te a cerca de 200 crianças, jovens e adultos. Sara Gomes com o retrato do seu grupo base, os Cavaleiros. 14 15 DIÁRIOS ACHADOS Há um tempo que não para Que persegue o meu inconsciente e o consciente Um tempo que prende o meu pensamento, que comanda os meus movimentos Um turbilhão de emoções e sensações invade o meu ser Estou sem rumo, sem direção, procuro sair da margem A margem... À margem do rio tento decifrar pensamentos, tento ser À margem do que sou, procuro seguir pela encruzilhada que me eleva À margem do meu eu, explode tudo o que não consigo ser Tudo o que me prende, me retrai A utopia de querer ser sempre mais, a minha vontade que tortura quem sou para não deixar de ser O limite não existe para aqueles que sonham ser Ser... ser... Ser a liberdade, a sinergia com a natureza, o sonho, a conquista, a descoberta Já não me prendo ao que não fui, ao que não sou e nunca me prendo ao que não conseguirei ser Porque isso sou eu quem decide. Porque “não conseguir ser” é um lema que limita aqueles que apenas procuram uma desculpa para não ferir o ego Porque até utilizarmos todos os recursos que temos, seguirmos todas as encruzilha- das possíveis, aliados ao tempo que nos persegue, ser é uma escolha E a margem, somos nós que a definimos A nossa margem, o nosso ponto de paragem que nos dá a falsa sensação de que o relógio parou e ganhamos espaço para pensar e decidir... Essa margem, só nós sabemos onde, quando e como acontece. E tu, já sabes onde fica a tua margem ou ainda foges dela? À MARGEM por Mariana Vilas Boas Qual foi o maior impacto da pande- mia na PASEC? E, consequentemen- te, na tua posição como Presiden- te? A maior consequência, pessoalmente, foi sentir que parte da essência da associação se perdeu. O abraço, o carinho, aquele con- tacto mais próximo que nós temos junto dos nossos participantes. Por outro lado, foi necessário reajustar totalmente aqui- lo que eram as nossas respostas, para que as mesmas continuassem a funcionar junto dos nossos e tal foi possível devido à com- petência dos animadores e voluntários que fazem parte da PASEC, o que a mim, en- quanto Presidente, me deixou bastante feliz. Face à pandemia, qual foi o mo- mento mais impactante no bom sentido? Foi assistir de perto às coisas ex- traordinárias que conseguimos fazer, desde o teatro aos campos de forma- ção que, mesmo em tempos de pande- mia, aconteceram e tiveram imenso êxi- to dentro da PASEC e na comunidade. Para além da PASEC, que outros projetos tiveste ou tens? Para além da PASEC, sou professo- ra numa escola profissional e faço par- te da direção de uma IPSS na qual assu- mo funções de gestão e coordenação. Que objetivos tens para o futuro enquanto Presidente? Para o futuro quero voltar a candida- tar-me (risos), e manter todas as dinâ- micas e, se for possível, melhorar e criar ainda mais oportunidades dentro da PA- SEC para o público que faz parte da as- sociação e com quem trabalhamos. Que objetivos tens para o futuro a nível pessoal? A nível pessoal, tenho um sonho es- condido que é fazer voluntariado num país africano ou até mesmo no Brasil. Um sonho que está na gaveta e que só sai- rá quando achar que a minha missão na- quilo que faço atualmente, terminou. Sara Gomes com elementos da equipa da PASEC Habitat 16 17 NOVELA Into the Book Estava particularmente escuro e ventoso quan- do os membros dos OUT, a Companhia de Es- crita Criativa, se sentaram aos seus computa- dores para a reunião quinzenal do seu grupo. Patrícia, a animadora, perguntou-se breve- mente se o tempo ia piorar durante o final da tarde enquanto enviava o link para o grupo do WhatsApp. De forma uniforme, aos poucos, todos foram entrando e as suas caras preen- chiam o ecrã. Trocaram as saudações do costu- me, contando as histórias da semana. A Bruna e o Telmo comentavam o exercício da semana nos grupos de Teatro ADN, a Oriana queixou- -se das dores habituais, a Mariana falava a mil à hora sobre tudo o resto, e a Carla bebia do seu habitual chá com o seu gatinho no colo, en- quanto a Margarida ia comendo distraidamente. - Ora bem, pessoal, vamos lá, senão é só treta e nada de reunião... - disse Patrícia. Com a habitual resistência os ânimos acalmaram-se, e a reunião pôde começar. – Então como sabem, a semana passada pedi para que trouxessem um livro recente que estão a ler e ou algo que vos marcou. Alguns participantes ergueram os seus li- vros para a Câmara, outros anuíram com a cabeça, um ou outro fez uma cara de li- geiro pânico por se terem esquecido. - E como tenho a certeza que todos se pre- param,eu não importo de começar, e depois vamos um a um. Assim continuou. A Patrícia, para surpresa de ninguém, escolheu um livro velho e aborrecido, um Eça desta vez, o Telmo trouxe um livro José Eduardo Agualusa “O vendedor de passados”, a Margarida touze um livro chamdo “Jesusalém” de Mia Couto, e assim foi passando a reunião. A última pessoa, por virtude das circunstâncias, foi a Bruna. Depois daquele novo ritual de falar duran- te 5 segundos antes de todo o grupo dizer ao mesmo tempo que tinha o microfone em mute. - Pronto, Conseguem ouvir-me agora? – per- guntou a Bruna e aproximou-se do seu portátil mais um pouco. – Ok, o livro que eu trouxe é um bocado diferente. Eu encontrei-o numa caixa perdida no sótão de casa quando estava a lim- par. Peguei nele e comecei a ler a ver o que era. Na sua mão a Bruna trazia um livro de capa dura, claramente antigo. De uma cor avermelhada, este livro não tinha um título na capa. A adornar a sua frente estava somente uma forma desenhada em dourada que se parecia vagamente com uma flor. - Eu estou mesmo a acabar, falta um ou dois capítulos. 1º Capítulo Mas a cena mais estranha nem é a história em si, é umas frases que alguém escreveu no livro, tipo nas margens. Deixa ver se vos consigo mostrar... Bruna começou a abrir o livro para mos- trar ao grupo quando, sem aviso, a chama- da de Zoom foi abaixo. Cada um na sua casa fez uma cara de espanto para o seu ecrã. Será que a reunião tinha chegado ao tempo limi- te e ninguém tinha reparado? Uma mensa- gem cai no grupo passado uns momentos. Patrícia Ribeiro: A chamada foi abaixo pesso- al. Entrem no mesmo link, deve funcionar! – 17:35 O ritual da entrada na chama de Zoom repetiu- -se, mas desta vez faltava uma pessoa: a Bruna, que 5 minutos depois ainda não tinha aparecido. - Oh Patrícia, não terá sido um problema do PC dela que mandou a chamada abaixo? – especulou o Telmo. - Não babe, porque a Patrícia é a anfitriã. Se o problema fosse dela, o link nem funcionava. – argumentou a Oriana. - Chica, porque não lhe ligas? – perguntou a Carla no seu familiar portinhol. Patrícia pegou no telemóvel ao mesmo tem- po instruía a Mariana para ir adiantando a lis- ta de tarefas para a ANIMAteca. Com o micro desligado, a Animadora encontra o número da Bruna nos contactos, mas não ouviu o habitu- al som de chamada, mas sim os beeps que in- dicavam que o telemóvel estava indisponível. E depois voltou a tentar, com o mesmo resultado. Era rara a ocasião em que Patrícia sentia a sensação que estava a experienciar. Sentia na pele, como uma eletricidade pesada, incómo- da. Fez um sinal com a mão para reunião con- tinuar enquanto procurava no computador a ver se encontrava os dados da Bruna, algu- res teria o número da mãe dela, seguramente. Ao colocar o número da mãe da Bruna no telemóvel, Patrícia disse a si mesma que es- tava tudo bem... - Estou sim? – respondeu uma voz do outro lado – Quem fala? - Boa tarde, daqui fala a Patrícia Ribeiro, sou animadora da Bruna do grupo de Escrita. Nós estamos a ter grupo agora online, mas a chamada foi a baixo. Estavamos a tentar ligar à Bruna para ela voltar a entrar na chamada. Ela está aí? - Ah, olá Patrícia. Nós aqui ficamos sem ele- tricidade à um bocado, acontece com o mau tempo. Espere... Do outro lado do telefone a Patrícia ou- viu o som de passos e portas a abrir, enquan- to deu uma olhada na reunião a acontecer no seu computador. Os participantes pareciam estar a rir-se de alguma coisa, sem partilhar a sensação esquisita que começava a viajar pela nuca da Patrícia. Como um tremor persistente. - Bruna? – Ouviu-se do telemóvel – Bruna? Estou? Patrícia, olhe ela não está no quarto. Deve ter ido ao sótão ver o quadro da Luz. E deixou aqui o telemóvel. Eu depois digo à Bruna para lhe ligar, okay? - Perfeito, obrigada! Com o telefonema acabado, Patrícia voltou a colocar os auscultadores para voltar à reunião online, mas aquela sensação começou a espa- lhar-se pelos braços, na ponta dos dedos...A ele- tricidade começou a agitar-se no peito. Mas ten- tou ignorar e voltar à reunião enquanto a Bruna não ligava. Mas sabia lá ela que a Bruna não iria ligar, mas iria sim receber uma chamada da mãe dela, já a noite ia longa, que a filha não estava em lado nenhum, e não tinha voltado a casa... 18 1ª edição | fevereiro 2021 Revista de Animação Sociocultural | Animateca | Projeto Editorial de Expressão PROPRIEDADE: PASEC Plataforma de Animadores Socioeducativos e Culturais Plataforma de Ação Socioeducativa e Cultural REDAÇÃO OUT Ana Luís Bruna Ribeiro Carla Pires Margarida Moreira Mariana Frutuoso Mariana Vilas Boas Patrícia Ribeiro Oriana Silva Telmo Pinheiro Companhia Literária e Escrita Criativa - OUT