UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA ELÉTRICA NÍVEL MESTRADO PROFISSIONAL VÍCTOR TISBIEREK PADILHA AVALIAÇÃO DO ESTADO DE VIDA DE BATERIAS PRIMÁRIAS POR ESPECTROSCOPIA DE IMPEDÂNCIA ELETROQUÍMICA SÃO LEOPOLDO 2020 Víctor Tisbierek Padilha Avaliação do estado de vida de baterias primárias por espectroscopia de impedância eletroquímica Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Engenharia Elétrica, pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS. Orientador: Prof. Dr. Carlos Alberto Cima São Leopoldo 2020 “O insucesso é apenas uma oportunidade para recomeçar com mais inteligência." (Henry Ford) RESUMO O armazenamento e o uso de energia sob condições restritivas de volume, peso e custo são tópicos de grande interesse na ciência e sociedade atuais. Com a onipresença de sistemas e dispositivos eletrônicos embarcados em nossa vida cotidiana, a eficiência com que armazenamos e utilizamos energia tem um impacto direto em todos os campos da atividade humana. Nesse âmbito, baterias ainda são consideradas a solução mais viável para o atingimento deste fim, sendo um dos principais objetos de estudos e pesquisa científica na atualidade (em especial as baterias secundárias de lítio, amplamente utilizadas como fonte de alimentação para smartphones, notebooks e carros elétricos). Com o desenvolvimento do conceito de Internet das Coisas (IoT), baterias primárias passam a ter um papel de maior destaque entre as soluções de energia para os novos dispositivos que são desenvolvidos todos os dias. No entanto, a confiabilidade destes dispositivos e sistemas, em especial aqueles móveis, tais como rastreadores e dispositivos de comunicação, é especialmente suscetível à condição das baterias e sua capacidade de fornecer a energia necessária durante todo o período de sua utilização. Assim, torna-se um fator crítico nestas aplicações que a bateria utilizada esteja em boas condições. Os principais parâmetros indicativos da condição de uma bateria são o seu state of charge (SOC) e state of health (SOH), e apesar da avaliação desses parâmetros dinâmicos permanecer até hoje uma tarefa complexa e difícil, existem muitas técnicas que se propõem a fazê-lo. Esse trabalho tem por objetivo primário o desenvolvimento de um método de avaliação do estado de vida de baterias primárias usando a técnica de espectroscopia de impedância eletroquímica. Palavras-chaves: Baterias primárias. State of charge. State of health. Espectroscopia de impe- dância. ABSTRACT The storage and usage of energy under restrictive conditions of volume, weight and cost are a very important topic of interest in today’s science and technology. With the overwhelming presence of embedded devices and systems in our daily lives, the efficiency with which we store and use energy has a direct impact on all fields of human activity. Within this scope, batteries are still considered the most feasible solution for this end, being one of the major fields of study and scientific research in today’s world (specially lithium secondary batteries, widely used for powering smartphones, notebooks and electric cars). With the advance of new concepts such as the Internet of Things (IoT), primary batteries have taken an important spot among the energy solutions for the new devices that are constantly designed everyday. However, the reliability of these devices and systems, and specially the mobile ones, such as trackers and communication devices, is particularly susceptible to the condition of the battery and its capacity to continually provide the necessary energy throughout their entire life spam. Therefore, it is important for critical applications that the battery is in a fine condition. The main status parameters that reflect the condition of a battery are its state of charge (SOC) and state of health (SOH), and despite their estimation remaining a very difficult and complex task, there are many different techniques that attempt to do it. This work aims to develop a method for the evaluation of the overall state of primary batteries through the employment of one of those techniques, the electrochemical impedance spectroscopy. Key-words: Primary batteries. State of charge. State of health. Impedance spectroscopy. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Figura esquemática de uma célula eletroquímica. . . . . . . . . . . . . . . . 15 Figura 2 – Representação de uma bateria em circuito aberto. . . . . . . . . . . . . . . 19 Figura 3 – Tensão de circuito aberto em função do SOC. . . . . . . . . . . . . . . . . 20 Figura 4 – Tensão de circuito aberto para diferentes composições de íon de lítio. . . . . 20 Figura 5 – Célula eletroquímica com a resistência do eletrólito. . . . . . . . . . . . . . 21 Figura 6 – Elemento de fase constante Q. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Figura 7 – Elemento de Warburg ZW . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 Figura 8 – Circuito equivalente de Randles. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 Figura 9 – Circuito equivalente de uma bateria de íons de lítio. . . . . . . . . . . . . . 25 Figura 10 – O diagrama de Nyquist. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 Figura 11 – Espectroscopia de impedância eletroquímica representada por meio do dia- grama de Nyquist. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 Figura 12 – Resposta de impedância do resistor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 Figura 13 – Resposta de impedância do capacitor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 Figura 14 – Impedância do circuito RC em série. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 Figura 15 – Impedância do circuito RC em paralelo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 Figura 16 – Resposta de impedância do elemento de fase constante. . . . . . . . . . . . 30 Figura 17 – Impedância do circuito CTE-R em paralelo. . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Figura 18 – Resposta de impedância do elemento de Warburg. . . . . . . . . . . . . . . 31 Figura 19 – Resposta de impedância de uma célula eletroquímica. . . . . . . . . . . . . 31 Figura 20 – Interface entre o eletrólito e um eletrodo poroso. . . . . . . . . . . . . . . . 32 Figura 21 – Interface ativa do eletrodo poroso em termos de blocos equivalentes. . . . . 32 Figura 22 – Circuito equivalente da linha de transmissão. . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 Figura 23 – Detalhes construtivos da bateria de Zinco Carbono (Leclanché). . . . . . . . 35 Figura 24 – Detalhes construtivos da bateria alcalina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 Figura 25 – Detalhes construtivos da bateria moeda de LiMnO2 . . . . . . . . . . . . . . 38 Figura 26 – Detalhes construtivos da bateria cilíndrica de NiMH. . . . . . . . . . . . . . 40 Figura 27 – Representação dos processos de carga e descarga da bateria de íons de lítio. 41 Figura 28 – Detalhes construtivos da bateria cilíndrica de íons de lítio. . . . . . . . . . . 42 Figura 29 – Curva de corrente x tensão mostrando a pseudo-linearidade de um sistema eletroquímico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Figura 30 – Respostas de impedância para ensaios potenciostáticos com sinais de tensão de diferentes valores eficazes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Figura 31 – Respostas de impedância para ensaios galvanostáticos com sinais de corrente de diferentes valores eficazes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 Figura 32 – Comparativo da resposta de impedância de uma célula eletroquímica no limiar (0,1 mA) e no interior (0,25 mA) de sua zona de pseudo-linearidade (Nyquist e Bode). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 Figura 33 – Comparativo de resultados da electroscopia de impedância de uma mesma amostra para diferentes amostragens. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 Figura 34 – Espectros de impedância de uma bateria com variações de 19% de SOC. . . 51 Figura 35 – Espectros de impedância de uma bateria com variações de 23% de SOC. . . 51 Figura 36 – Curvas de descarregamento de uma célula alcalina Duracell Plus Power AA com diferentes taxas de descarregamento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 Figura 37 – Curvas de descarregamento de dois modelos de células alcalinas a uma taxa de 100 mA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 Figura 38 – Soquete AA duplo diretamente soldado a um resistor de 16 W. . . . . . . . 53 Figura 39 – Equipamento potenciostato e rotina de teste utilizados. . . . . . . . . . . . . 54 Figura 40 – Setup de teste das baterias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 Figura 41 – Respostas de impedância das 4 baterias para diferentes níveis de carga. . . . 58 Figura 42 – Respostas de impedância da Bateria no 2 para diferentes níveis de carga. . . 59 Figura 43 – Respostas de impedância da Bateria no 2 quando totalmente carregada (SOC = 100%) e levemente descarregada (SOC = 95%). . . . . . . . . . . . . . . 59 Figura 44 – Resposta de impedância da Bateria no 1 (SOC = 80%) e seu circuito equivalente. 60 Figura 45 – Respostas de impedância das baterias para os níveis de carga 75%, 50% e 25%. 61 Figura 46 – ANOVA da componente imaginária da impedância entre grupos de baterias. 63 Figura 47 – ANOVA da componente real da impedância entre grupos de baterias. . . . . 64 Figura 48 – ANOVA do deslocamento de fase da corrente entre grupos de baterias. . . . 64 Figura 49 – ANOVA tensão de circuito aberto entre grupos de baterias. . . . . . . . . . 64 Figura 50 – Efeito dos fatores A e B sobre a componente imaginária da Impedância. . . 67 Figura 51 – Efeito dos fatores A e B sobre a componente real da Impedância. . . . . . . 67 Figura 52 – Efeito dos fatores A e B sobre a Impedância total. . . . . . . . . . . . . . . 68 Figura 53 – Efeito dos fatores A e B sobre o deslocamento de fase da corrente. . . . . . 68 Figura 54 – Ábaco: Carga (%), Frequência (Hz) e Zimag. (W) . . . . . . . . . . . . . . . 69 Figura 55 – Ábaco: Carga (%), Frequência (Hz) e Zreal (W) . . . . . . . . . . . . . . . . 70 Figura 56 – Ábaco: Carga (%), Frequência (Hz) e Z (W) . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 Figura 57 – Ábaco: Carga (%), Frequência (Hz) e Deslocamento de Fase (o ) . . . . . . . 72 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Potenciais padronizados de redução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 Tabela 2 – Tensão nominal de alguns tipos comuns de baterias. . . . . . . . . . . . . . 17 Tabela 3 – Baterias primárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 Tabela 4 – Baterias secundárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 Tabela 5 – Número de ensaios por agrupamento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 Tabela 6 – Disposição dos dados para análise de variância de vários grupos. . . . . . . 62 Tabela 7 – Teste F. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63 Tabela 8 – Disposição dos dados para experimento fatorial de dois fatores. . . . . . . . 65 Tabela 9 – Análise de Variância para dois fatores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Tabela 10 – Baterias de contraprova para estimação de nível de carga. . . . . . . . . . . 73 Tabela 11 – Resultados dos testes de inferência de nível de carga das baterias utilizando os modelos de regressão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 Tabela 12 – Resultados dos testes de inferência de nível de carga das baterias utilizando os gráficos de 2 fatores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BMS Battery Management System - Sistema de gerenciamento de baterias CTE Elemento de fase constante EIS Electrochemical Impedance Spectroscopy - Electroscopia de impedância eletroquímica ENA Electrochemical Noise Analysis - Análise de ruído eletroquímico IoT Internet of Things - Internet das Coisas Li-ion Bateria de íons de lítio LiMnO2 Bateria de lítio-dióxido de manganês LiPb Bateria de lítio-chumbo LiSO2 Bateria de lítio-dióxido de enxofre NiCd Bateria de níquel-cádmio NiMH Bateria de níquel-hidreto metálico OCV Open Circuit Voltage - Tensão de circuito aberto da bateria pH Escala numérica adimensional que quantifica a acidez ou alcalinidade de uma solução RC Circuito resistor-capacitor RMS Root mean square - Representa o valor eficaz de um sinal alternado RVM Relevance Vector Machine SOC State-of-charge - Nível de carga da bateria SOH State-of-health - Nível de integridade da bateria ZnO Óxido de zinco LISTA DE SÍMBOLOS Ah Ampere-hora Wh Watt-hora W Watt j Número imaginário usado para indicar o componente reativo da impedância w Frequência angular Z Impedância R Resistência C Capacitância W Ohm Hz Hertz L Indutância SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 1.1 Justificativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 1.2 Objetivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 2.1 O funcionamento da bateria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 2.2 Conceitos básicos da bateria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 2.2.1 Tensão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 2.2.2 Capacidade de Carga . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 2.2.3 Capacidade Energética . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2.2.4 Estado de carga . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2.2.5 Estado de vida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 2.3 Modelos elétricos equivalentes da bateria . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.3.1 Tensão de circuito aberto (OCV) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.3.2 Estado de carga (SOC) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.3.3 Resistência do eletrólito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 2.3.4 Capacitância de interface . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 2.3.5 O elemento de fase constante (CTE) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 2.3.6 Resistência de transferência de carga . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 2.3.7 Difusão e o elemento de Warburg . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 2.3.8 O modelo equivalente de Randles . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 2.3.9 O modelo equivalente a partir de dados experimentais . . . . . . . . . . . . 25 2.3.9.1 O diagrama de Nyquist . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 2.3.9.2 Resistor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 2.3.9.3 Capacitor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 2.3.9.4 Circuitos RC . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 2.3.9.5 O elemento de fase constante e o elemento de Warburg . . . . . . . . . . . . 29 2.3.9.6 Interpretando a resposta de impedância de um sistema . . . . . . . . . . . . 31 2.3.10 Linhas de transmissão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 2.4 Tipos de baterias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 2.4.1 Baterias primárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 2.4.1.1 Baterias de Zinco Carbono . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 2.4.1.2 Baterias Alcalinas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 2.4.1.3 Baterias primárias de Lítio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 2.4.2 Baterias secundárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 2.4.2.1 Baterias de Níquel Hidreto Metálico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 2.4.2.2 Baterias de Íons de Lítio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 2.5 Trabalhos Similares e Estado da Arte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 3 MATERIAIS E MÉTODOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 3.1 Proposta de Pesquisa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 3.2 Espectroscopia de impedância eletroquímica . . . . . . . . . . . . . . . . 46 3.2.1 Espectroscopia de impedância potenciostática x galvanostática . . . . . . . 47 3.2.2 Linearidade de sistemas eletroquímicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 3.3 Definição do tipo de ensaio e dimensionamento do sinal de estímulo . . . 48 3.4 Faixa de medição e amostragem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 3.5 Definição dos níveis de carga . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 3.6 Método de descarregamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 3.7 Execução dos ensaios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 3.8 Projeto de experimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 3.8.1 Terminologia do Projeto de Experimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 3.8.2 Dimensionamento da amostragem e total de ensaios . . . . . . . . . . . . . 55 3.9 Sumário do experimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 4 RESULTADOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 4.1 Análise das respostas de impedância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 4.2 Comparação de vários grupos (One-way Analysis of Variance) . . . . . 61 4.2.1 Análise de Variância (ANOVA) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 4.3 Experimento fatorial de dois fatores (Two-way Analysis of Variance) . . 65 4.4 Modelagem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 4.4.1 Ábacos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 4.4.2 Modelos de 2 Fatores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 4.4.3 Modelo de 1 Fator-Correlação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 4.5 Contraprova . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 5 CONCLUSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75 REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76 12 1 INTRODUÇÃO O uso de eletrônicos já está intimamente relacionado com as vidas humanas. De notebo- oks e smartphones a instrumentos médicos e unidades de controle de aeronaves, dispositivos eletrônicos são utilizados em uma infinidade de produtos e em uma variedade cada vez maior de ambientes e contextos. A tendência dominante é em direção a dispositivos cada vez menores, mais leves e mais rápidos (LICARI, 2003). Existe ainda um outro fenômeno que, acredita-se, aumentará exponencialmente a pre- sença de dispositivos eletrônicos em todas os facetas da vida humana. Hoje em dia, a principal forma de comunicação na Internet é homem-homem. Porém, em um futuro próximo todo objeto terá sua própria forma de comunicação e poderá ser endereçado, de forma que tudo estará conec- tado. A Internet se tornará a Internet das Coisas. As formas de comunicação vão se expandir de homem-homem para homem-homem, homem-objeto e objeto-objeto. Em última instância, isso nos levará à uma nova era de comunicação e computação onipresentes, mudando drasticamente a vida humana (TAN; WANG, 2010). Isso significa que o mundo está diante de grandes desafios. Por um lado, a população do planeta já atingiu 7 bilhões de pessoas e pode chegar a 10 bilhões nas próximas décadas. Pelo outro, a tecnologia está avançando incrivelmente rápido. Essa mistura significa que a necessidade de energia está aumentando, e de maneira imprevisível. Devido a esses aspectos, a dúvida a respeito da quantidade de energia acessível no futuro próximo é uma preocupação global. O impacto do aumento populacional e da propagação da tecnologia em nossa sociedade agora e no futuro se tornou um ponto chave na manutenção da vida humana. Seja qual for o método de geração de energia para qual o mundo venha a caminhar, ser capaz de armazenar energia de maneira eficiente é uma questão fundamental em qualquer futuro previsível (BERECIBAR et al., 2016). Ainda que hoje as tecnologias mais modernas de armazenagem de energia tenham se movido em direção às células recarregáveis secundárias, que incluem químicas de hidreto de níquel e íon de lítio, ainda há uma demanda significativa por células alcalinas primárias, que são comparativamente mais baratas que as células recarregáveis modernas, possuem longa validade e boas densidades de energia. Este é um cenário que tende a ficar ainda mais pronunciado com as novas aplicações e dispositivos eletrônicos que passarão a inundar a vida humana com a popularização do conceito de Internet das Coisas, uma vez que células alcalinas primárias são uma fonte relativamente barata de energia portátil e que pode ser usada nas mais variadas aplicações diárias (FERG; VUUREN, 2014). À medida que mais aplicações dependem de mobilidade e independência da rede, a necessidade de garantir a carga e a condição das baterias têm se tornado uma tarefa cada vez Capítulo 1. Introdução 13 mais importante. Para isso, muito esforço tem sido feito em anos recentes para determinar precisamente o state of charge (SOC) e o state of health (SOH) de uma bateria. Apesar de muitos métodos terem sidos desenvolvidos e propostos para esse fim, com variados graus de sucesso, estimar com precisão os parâmetros dinâmicos de status de uma bateria permanece até hoje uma tarefa difícil e complexa (DENSMORE; HANIF, ). 1.1 Justificativa A flutuação dos preços do petróleo e a conscientização mundial em relação às causas ambientais têm resultado no contínuo desenvolvimento de sistemas de armazenagem de energia. Por conta de sua alta eficiência e baixo impacto ambiental, a bateria se apresenta como um dos mais atrativos sistemas de armazenagem de energia. Entre as vantagens das baterias, estão a longa vida útil, baixa poluição, alta densidade de energia e a possibilidade de fornecimento de alta corrente na descarga. Por tudo isso, tornam-se ideais para o uso em dispositivos portáteis, veículos elétricos e as mais diversas aplicações industriais (RAO; WANG; ZHANG, 2011). Um dos principais indicadores do estado atual de uma bateria é o SOC, que descreve o nível da carga armazenada na bateria ainda disponível para utilização, em relação à sua carga total original. Desta forma, o SOC terá um nível de 100% quando a bateria estiver nova, e um nível de 0% quando a bateria estiver completamente depletada. Além de descrever a capacidade restante da bateria, o SOC também tem influência direta em sua performance, uma vez que a tensão provida pela bateria varia conforme seu estado de carga. Assim, a correta avaliação do SOC faz-se muito importante para a o estabelecimento de estratégias de controle, tornando possível proteger a bateria, prevenir a sobredescarga e otimizar a vida da bateria, além de possibilitar à aplicação à qual ela é destinada estabelecer estratégias de controle que resultem na economia de energia (CAI; LIU; LUO, 2010). Entretanto, a bateria é uma fonte de energia química, e energia química não é um tipo de energia facilmente quantificado. Por conta disso, determinar o SOC de uma bateria acaba se tornando uma tarefa difícil. O que torna tão complexa e difícil a estimação do SOC são as limitações nos modelos elétricos equivalentes utilizados para descrever uma bateria, bem como as incertezas paramétricas decorrentes do modelo utilizado. Como resultado, muitos exemplos de baixa precisão e confiabilidade na estimação do SOC são encontrados na prática (ELGAMMAL; SHARAF, 2012). Entre os muitos métodos utilizados para a estimação do SOC de uma bateria, está a espectroscopia de impedância (EIS). Esta técnica permite a caracterização das propriedades elétricas dos materiais e suas interfaces com eletrodos eletronicamente condutivos, possibilitando a investigação das dinâmicas de cargas no interior do material e nas regiões de interface de quais- quer tipos de materiais: iônicos, semicondutores, eletrônico-inônicos e até mesmo dielétricos. Desta forma, o emprego da espectroscopia de impedância figura como uma excelente alternativa Capítulo 1. Introdução 14 para a determinação das condições gerais de baterias (Frontmatter, 2005). 1.2 Objetivos O objetivo principal deste trabalho é avaliar, através da aplicação de uma técnica de espectroscopia de impedância eletroquímica, o SOC de baterias alcalinas primárias. Além disso, este trabalho também tem como objetivo: • Desenvolver o modelo elétrico equivalente das baterias a partir de sua resposta de impe- dância; • Caracterizar as curvas de impedância das baterias ao longo de diferentes níveis de SOC; • A partir da caracterização de valores de impedância conhecidos para diferentes níves do SOC da bateria, desenvolver um teste elétrico rápido capaz de estimar o SOC atual de uma dada bateria. 15 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Neste capítulo, serão abordados os conceitos que fundamentam este trabalho, sendo eles os conceitos eletroquímicos por trás do funcionamento de baterias, a apresentação dos seus modelos elétricos equivalentes e uma revisão dos métodos hoje utilizados para a estimação dos seus parâmetros de status. 2.1 O funcionamento da bateria Baterias são, talvez, a aplicação mais emblemática da área da ciência conhecida como eletroquímica. Uma célula eletroquímica utiliza reações químicas para a geração de energia (ou vice-versa). Basicamente, ela consiste de um eletrodo positivo (chamado cátodo) e um eletrodo negativo (chamado ânodo), separados por um eletrólito capaz de conduzir íons entre os eletrodos, mas que é um isolante elétrico em si. Se o eletrólito fosse um condutor, daria vez à auto-descarga da bateria ou, ainda pior, curtocircuitaria os dois eletrodos (ocasionando reações químicas não controladas que poderiam resultar em grande liberação de calor, com risco de fogo ou explosão) (DELL; RAND, 2001). A Figura 1 mostra o esquemático de uma célula eletroquímica. Figura 1 – Figura esquemática de uma célula eletroquímica. Fonte: Adaptado de Jongerden, Haverkort (2008). Uma bateria, consiste em uma ou mais células eletroquímicas conectadas em série ou em paralelo. Nessas células, a energia quimicamente armazenada é convertida em energia elétrica através de reações eletroquímicas. Cada uma das reações que ocorrem nos eletrodos são chamadas de semi-reações. Durante a descarga, uma reação de oxidação ocorre no eletrodo negativo. Nesta reação, um metal (M) doa n elétrons, que são liberados no circuito da carga Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 16 conectada aos terminais da bateria. No eletrodo positivo, ocorre uma reação de redução. Isto é, n elétrons são aceitos por um oxidante (X): 8 <M ! M n+ + ne , no ânodo, :nX + ne ! nX , no cátodo. Assim, durante a descarga da bateria, íons negativos (ânions) se movem em direção ao eletrodo negativo, e íons positivos (cátions) se movem em direção ao eletrodo positivo. Desta forma, quando as reações químicas de uma célula eletroquímica geram corrente elétrica, diz-se que essa é uma célula galvânica. Durante o carregamento da bateria, no entanto, o fluxo de íons é inverso, e a bateria se torna uma célula eletrolítica (JONGERDEN; HAVERKORT, 2001). A tensão de uma bateria é dada pela diferença entre os potenciais padrão de redução (E) dos dois eletrodos. A Tabela 1 apresenta os potenciais de redução de diversos materiais comumente utilizados em composições de células eletroquímicas. No entanto, a diferença entre os potenciais dos eletrodos negativo e positivo representará a tensão de circuito aberto da bateria, isto é, quando não há corrente elétrica circulando entre os terminais. Tabela 1 – Potenciais padronizados de redução. Fonte: Adaptado de (PLETT, 2015). Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 17 É importante ressaltar que se medirmos a tensão de uma bateria quando conectada à uma carga, ela certamente será inferior do que em circuito aberto. Isso ocorre em função da impedância interna da bateria, consistindo de perdas por polarização nos eletrodos e da resistência interna da bateria. Esses conceitos serão apresentados mais adiante neste trabalho. 2.2 Conceitos básicos da bateria Antes de seguir adiante com a análise detalhada dos fenômenos eletroquímicos aconte- cendo no interior da célula e de poder correlacioná-los com parâmetros úteis que possam ajudar a determinar as características e o estado geral de um dado sistema, é importante que alguns conceitos e terminologia básica das baterias sejam cobertos. 2.2.1 Tensão A tensão de uma célula eletroquímica é dada em volts (V) e depende de uma série de fatores, dos quais o mais importante é a composição dos materiais que a compõem, em especial os eletrodos negativo e positivo. Isso porque a tensão padrão de uma bateria é dada pela diferença dos potenciais de redução dos eletrodos. No entanto, há diversos outros fatores que podem ter um papel importante na determinação da tensão efetiva de uma bateria. A Tabela 2 mostra a tensão nominal de alguns tipos comuns de baterias. Tabela 2 – Tensão nominal de alguns tipos comuns de baterias. Fonte: Adaptado de (PLETT, 2015). 2.2.2 Capacidade de Carga A capacidade de carga de uma bateria especifica a quantidade de carga, em ampere-hora (Ah), que essa bateria é capaz de armazenar. Diretamente relacionada com a quantidade de carga, está a taxa de descarga C (em horas). A taxa de descarga C descreve qual a corrente necessária para descarregar uma dada bateria no período de 1 hora. Desta forma, afirmar que uma Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 18 determinada bateria de 30-Ah foi descarregada à uma taxa C/10 significa dizer que a corrente de descarga foi de 3 A (a corrente necessária para descarregar completamente a bateria em 10 horas). 2.2.3 Capacidade Energética A capacidade energética de uma bateria descreve a quantidade de energia elétrica, em watt-hora (Wh), que essa bateria é capaz de armazenar. A capacidade energética da bateria é calculada mustiplicando sua tensão nominal por sua capacidade de carga. Assim, uma dada bateria de 1,5V e 10-Ah, terá uma capacidade energética de 15 Wh. No entanto, é importante ressaltar que energia e potência (W) são coisas diferentes, uma vez que potência é a taxa instantânea com a qual a energia está sendo liberada. A potência que uma determinada bateria é capaz de fornecer está diretamente relacionada com sua resistência interna. 2.2.4 Estado de carga O estado de carga (SOC) de uma bateria denota o quanto uma bateria foi descarregada em relação à sua capacidade nominal. Assim, uma bateria totalmente carregada terá um SOC de 100%, enquanto uma bateria totalmente descarregada terá um SOC de 0%. Conhecer o SOC de uma bateria é importante por diversos motivos. De um ponto de vista de modelagem, as características dinâmicas da baterias mudam com o SOC. De uma perspectiva de diagnóstico, certas baterias secundárias podem sofrer danos irreversíveis se operadas com baixo SOC. 2.2.5 Estado de vida De maneira geral, não existe uma definição universal a respeito do que é o estado de vida (SOH) de uma bateria, sendo o seu significado dependente da aplicação em questão. De qualquer forma, em todos os casos o SOH quantifica o quanto a performance de uma bateria foi reduzida em relação a seu estado original, e é expressado em termos percentuais. Assim, uma bateria nova terá um SOH de 100%, e uma bateria que ultrapassou o nível mínimo aceitável de operação terá um SOH de 0%. Para algumas aplicações, a principal métrica de interesse em uma bateria é sua capacidade, então o SOH será estimado com base na perda de capacidade que a bateria apresenta, e ela atingirá o fim da vida útil quando sua capacidade ultrapassar um determinado valor mínimo. Para outra aplicações, no entanto, a característica de performance mais importante de uma bateria pode ser a potência instantânea que ela é capaz de fornecer, e nesse caso o SOH será estimado com base no aumento da resistência interna da bateria. Quando a resistência interna da bateria ultrapassar um determinado valor máximo, terá atingido o final da vida útil. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 19 2.3 Modelos elétricos equivalentes da bateria Modelar a bateria através de um circuito elétrico equivalente é útil para que seja possível entender como ela se comportará em diferentes cenários, e também é adequado para o design de algumas aplicações. Para que se possa representar a bateria através de um circuito elétrico equivalente, é necessário traçar analogias dos fenômenos físicos que ocorrem no interior da bateria por meio da utilização de elementos elétricos conhecidos. Desta forma, para que se possa fazer a representação de uma célula eletroquímica capaz de aproximar adequadamente os comportamentos exibidos pelos fenômenos que ocorrem em seu interior, é preciso ter um certo entendimento de como essa célula realmente funciona. Para isso, talvez seja melhor começar pelo modelo elétrico mais simples. 2.3.1 Tensão de circuito aberto (OCV) O modelo mais simples possível para uma bateria é o modelo de uma fonte ideal de tensão. Nessa condição, a tensão não é uma função da corrente, é invariável no tempo e constante. A Figura 2 mostra a representação do modelo de circuito aberto de uma bateria. Figura 2 – Representação de uma bateria em circuito aberto. Fonte: Adaptado de Bard, Faulkner (2000). Ainda que inadequado para a representação de uma bateria, esse modelo é útil por prover um bom ponto de partida para a interpretação de uma célula eletroquímica. Isso porque uma bateria realmente provê tensão para uma carga, e quando desconectada da carga essa tensão é razoavelmente previsível. 2.3.2 Estado de carga (SOC) Na prática, quando uma bateria está totalmente carregada sua tensão de circuito aberto é superior do que quando ela está descarregada. Assim, o estado de carga de uma célula eletroquí- mica deve ser também levado em conta no seu modelo representativo. O estado de carga z(t) da bateria pode ser definido como 100% quando ela está totalmente carregada e 0% quando ela está totalmente descarregada. A Figura 3 incorpora o estado de carga ao modelo de circuito aberto de uma bateria. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 20 Figura 3 – Tensão de circuito aberto em função do SOC. Fonte: Adaptado de Bard, Faulkner (2000). Uma vez introduzido o conceito de estado de carga, pode-se definir a capacidade total Q de uma célula eletroquímica como a carga total removida quando descarregando a célula de z = 100% até z = 0% (Q é medida em Ah ou mAh). O estado de carga SOC e a taxa de descarregamento ż (onde ż = dz/dt e h(t) é o fator de eficiência) de uma bateria podem ser definidos como: Z t 1 z(t) = z(t0 ) i(t)dt (1) Q t0 i(t)h(t) ż(t) = (2) Q A Figura 4 mostra as curvas de tensão de circuito aberto em função do SOC para três composições diferentes de baterias de íon de lítio. Figura 4 – Tensão de circuito aberto para diferentes composições de íon de lítio. Fonte: Adaptado de Eddahech, Briat e Vinassa (2014). 2.3.3 Resistência do eletrólito A tensão de uma célula eletroquímica cai quando há uma carga conectada aos seus terminais. Isso acontece devido à polarização da célula e também à sua resistência interna. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 21 Usualmente, a principal contribuição para a resistência interna da bateria vem da resistência do eletrólito. A resistência de uma solução iônica depende da concentração iônica, do tipo dos íons que a compõem, da temperatura e da geometria da área através da qual a corrente é carregada. Em uma área delimitada com área A e comprimento l, a resistência Rs do eletrólito é definida como: l Rs = r (3) A Onde r é a resistividade da solução. Na prática, o inverso de r, a condutividade k é mais comumente utilizada. É possível expressar resistividade do eletrólito em função da condutividade da solução da seguinte forma: 1 l l Rs = ) k= (4) kA Rs A No entanto, a maioria das células eletroquímicas não possuem uma distribuição de corrente uniforme através de uma área definida de eletrólito. Assim, torna-se muito difícil calcular a resistência do eletrólito sem ter como determinar o caminho do fluxo de corrente e a geometria do eletrólito que conduz a corrente. A Figura 5 mostra o modelo da célula eletroquímica com a inclusão da resistência do eletrólito. Figura 5 – Célula eletroquímica com a resistência do eletrólito. Fonte: Adaptado de Bard, Faulkner (2000). 2.3.4 Capacitância de interface Quando o potencial de um eletrodo é alterado, altera-se também a carga na interface eletrodo-eletrólito e, consequentemente, a distribuição dos íons na solução próximos à ela. Na realidade, esses íons são adsorvidos sobre a superfície do eletrodo, formando um filme fino sobre ele mas mantendo um espaço isolante entre eles da ordem de ângstrons. Como se sabe, cargas que são separadas por um isolante formam um capacitor. Assim, um eletrodo metálico imerso em eletrólito vai se comportar como um capacitor. O valor dessa Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 22 capacitância é uma função de diversos fatores, tais como potencial do eletrodo, temperatura, concentração iônica, o tipo dos íons presentes na solução, camadas de óxido que possam estar presentes, adsorção de impurezas presentes na solução, rugosidade e defeitos no eletrodo, etc. 2.3.5 O elemento de fase constante (CTE) Muitas vezes, sistemas eletroquímicos apresentam processos que não possuem equiva- lência com um componente elétrico real. Quando isso acontece, é preciso criar novos elementos de maneira a representar de maneira mais precisa o comportamento real desses sistemas. Um dos mais conhecidos destes elementos é o elemento de fase constante (Q). A Figura 6 mostra o símbolo comumente usado para a representação deste elemento. Figura 6 – Elemento de fase constante Q. Fonte: Jorcim, Orazem e Pébère (2006). O elemento de fase constante representa a capacitância "imperfeita"que se observa na in- terface do eletrodo com o eletrólito. Por causa de fatores físicos como a rugosidade da superfície do eletrodo, impurezas no eletrólito e da distribuição das reações iônicas acontecendo, a capacitân- cia de interface observada se comporta de maneira diferente da capacitância "pura"representada pelo capacitor. Com o elemento de fase constante, a resistividade "real"também aumenta à medida que a frequência diminui. O elemento de fase constante é expresso de maneira bastante similar ao capacitor: 1 ZQ = (5) Q0 ( jw)n Onde Q0 é a capacitância e n é a fase constante (-90 x n)o , tendo n um valor variando de 0 a 1 (sendo 1 o valor correspondente à capacitância perfeita). 2.3.6 Resistência de transferência de carga Sempre que o potencial de um eletrodo é forçado para além de seu valor em circuito aberto, diz-se que o eletrodo está polarizado. Quando o eletrodo é polarizado, existe o fluxo de corrente através das reações que acontecem em sua superfície. A resistência à passagem dessa corrente pode se manifestar de diferentes formas, mas talvez a mais comum seja a resistência de transferência de carga Rct . Considerando as reações eletroquímicas fundamentais que estão ocorrendo no interior da célula, temos elétrons entrando no metal e íons de metal se difundindo no eletrólito. Como Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 23 resultado, há a transferência de carga. Essa transferência de carga tem uma certa velocidade, que depende do tipo de reação, da temperatura, da concentração dos produtos reagentes e do potencial. A resistência intrínseca experimentada pela carga transferida na interface eletrodo-eletrólito é chamada resistência de transferência de carga, e pode ser expressa como: RT Rct = (6) nFi0 Onde R é a constante universal dos gases, T é a temperatura, n é o número de elétrons envolvidos, F é a constante de Faraday e i0 é a densidade da corrente. 2.3.7 Difusão e o elemento de Warburg Entre os processos de transferência de carga no interior de uma célula eletroquímica, está a difusão dos íons no eletrólito. A difusão representa o movimento dos íons de uma zona de alta concentração, próximo ao eletrodo, em direção à massa principal do eletrólito, onde há uma menor concentração. Existem diversos elementos que foram criados para representar este processo, dependendo se a espessura da camada de difusão é conhecida ou não e das características da sua interface, mas o mais comum é o elemento de Warburg W (também chamado impedância de Warburg ZW ), que modela a difusão linear semi-infinita. a ja ZW = p p (7) w w Onde a é o coeficiente de Warburg. O elemento de Warburg se comporta de maneira bastante semelhante ao elemento de fase constante, exceto com um ângulo de fase fixo em 45o . Em termos práticos, quando a frequência tende ao infinito, a impedância de Warburg ZW tende a zero. Quando a frequência tende a zero, a impedância de Warburg ZW tende ao infinito. A Figura 7 mostra o símbolo comumente utilizado para representar o elemento de Warburg. Figura 7 – Elemento de Warburg ZW . Fonte: Jorcim, Orazem e Pébère (2006). A importância do elemento de Warburg na representação de uma célula eletroquímica depende do tipo de reação ocorrendo no sistema. Reações eletroquímicas na superfície de um eletrodo podem ser limitadas por dois fatores: cinética e difusão. Se a taxa com que a carga é movida através da interface, do eletrólito para o eletrodo (ou vice-versa), for muito rápida, então a velocidade da reação será controlada primariamente pela taxa de difusão iônica no Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 24 eletrólito. Nesse caso, a impedânda da difusão terá um papel importante na modelagem do circuito equivalente da célula. Se a taxa com que a carga é difundida da interface para o centro da massa do eletrólito for muito rápida, então a reação será controlada pela velocidade com que a carga é transportada através da interface, de uma fase para outra do conjunto eletrodo-eletrólito. Neste caso, a impedância de difusão terá um papel diminuído na representação do sistema (PAL; SAXENA; MANDAL, 2017). 2.3.8 O modelo equivalente de Randles O modelo equivalente de Randles é, provavelmente, o modelo de equivalência mais comum para uma célula eletroquímica. Ele representa uma reação faradaica controlada por uma difusão semi-infinita. A Figura 8 mostra o circuito elétrico equivalente de Randles. Figura 8 – Circuito equivalente de Randles. Fonte: Jorcim, Orazem e Pébère (2006). Um modelo simples para um eletrodo imerso em um eletrólito é simplesmente a re- sistência do eletrólito RS em série com a capacitância de interface Cd l que será formada na superfície do eletrodo quando ele for polarizado (no modelo, representada por um elemento de fase constante, mais adequado para representar o comportamento real do sistema em questão). Se uma reação faradaica estiver ocorrendo (isto é, se houver reações eletroquímicas na interface eletrodo-eletrólito gerando corrente elétrica), então essa reação vai estar ocorrendo simultaneamente com o "carregamento” provocado pelo efeito capacitivo da interface. Assim, os elementos representativos da transferência da carga entre o eletrodo e o eletrólito (Rct ) e da difusão da carga através do eletrólito (ZW ) são colocados em paralelo à capacitância de interface. Finalmente, como a reação ocorrendo nessa célula é controlada primariamente pela difusão das cargas no eletrólito, a resistência de transferência de carga Rct é colocada em série com a impedância de Warburg ZW . O circuito equivalente de Randles descreve uma célula eletroquímica simples e não serve para descrever outros sistemas eletroquímicos complexos. A Figura 9 mostra o exemplo do modelo equivalente completo de uma bateria de íon de lítio. No entanto, o modelo de Randles tem grande utilidade para demonstrar como funciona o método de modelagem de Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 25 circuitos equivalentes para células eletroquímicas, além de prover um bom ponto de pertida para modelagens mais complexas. Figura 9 – Circuito equivalente de uma bateria de íons de lítio. Fonte: Adaptado de Choi, Shin, Kim et. al. (2020). 2.3.9 O modelo equivalente a partir de dados experimentais Todo o conceito de circuito elétrico equivalente deriva da comparação da resposta em impedância de um dado circuito ao longo de uma faixa de frequências com a resposta em impedância de um determinado sistema eletroquímico real. Para interpretar as características de impedância de um sistema verificadas experimen- talmente e correlacioná-las com um dado modelo equivalente constituído de componentes elétricos reais, é preciso compreender como se comportam esses componentes com a variação da frequência. As principais ferramentas para representar a resposta de impedência de um sistema ao longo de uma faixa de frequências são o diagrama de Bode e, especialmente, o diagrama de Nyquist (que será utilizado como ferramenta de análise ao longo de todo este trabalho). 2.3.9.1 O diagrama de Nyquist O diagrama de Nyquist é a curva traçada ligando os pontos que representam a resposta da função de transferência de malha aberta de cada frequência, através de uma faixa de frequências (W Bolton, 2004). Em diagramas cartesianos, a parte imaginária da resposta de frequência é representada no eixo Y, ao passo que a parte real da resposta de frequência é representada no eixo X. A Figura 10 mostra a representação de uma curva de respostas de frequência por meio do diagrama de Nyquist. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 26 Figura 10 – O diagrama de Nyquist. Fonte: Adaptado de (W Bolton, 2004) Do ponto de vista da análise de espectroscopia de impedância, cada ponto no diagrama representa a resposta de impedância da célula eletroquímica para uma determinada frequência, estando a parte imaginária da impedância (reatância) para aquela determinada frequência repre- sentada no eixo Y, enquanto a parte real da impedância (resistência) é representada no eixo X. A linha que liga os pontos das respostas para todo o espectro de frequências resulta na curva que compõe o diagrama em si. A Figura 11 exemplifica a utilização do diagrama de Nyquist como ferramente de análise da espectroscopia de impedância eletroquímica. Figura 11 – Espectroscopia de impedância eletroquímica representada por meio do diagrama de Nyquist. Fonte: Adaptado de (CHOI et al., 2020) A limitação do diagrama de Nyquist é que ele não indica a direção das frequências, de modo que sozinho ele não é capaz de transmitir a informação completa que define o compor- tamento de um sistema. Ao analisar o diagrama de Nyquist, é preciso levar em consideração o sistema por ele representado, e a partir daí inferir o sentido traçado pela curva quando ela vai da menor à maior frequência. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 27 2.3.9.2 Resistor É o mais simples componente elétrico existente. O resistor respeita a lei de Ohm, de modo que a corrente fluindo através dele dependerá apenas do potencial existente entre seus terminais. Em outras palavras, a resistência oposta à passagem da corrente é totalmente real, não havendo componente reativo. A impedância ZR do resistor pode ser descrita simplesmente como: ZR = R (8) No diagrama de Nyquist, o resistor aparece como apenas um ponto, invariante com a frequência e deslocado da origem do diagrama na mesma razão da magnitude da sua resistência. A Figura 12 mostra o diagrama de Nyquist da resposta de impedância de um resistor através de um range de frequências. Figura 12 – Resposta de impedância do resistor. Fonte: Adaptado de Jorcim, Orazem e Pébère (2006). 2.3.9.3 Capacitor Ao contrário do resistor, o capacitor tem uma impedância puramente reativa. Quando a frequência tende a zero, o capacitor estará totalmente carregado e não haverá mais o fluxo de corrente elétrica (agindo como um circuito aberto). Quando a frequência tende ao infinito, a rápida inversão da polarização das placas do capacitor manterá os elétrons de ambos os lados em perpétuo movimento, e o fluxo de corrente será o mesmo que de um curto-circuito. Assim, tem-se que a impedância ZC do capacitor é inversamente proporcional à frequência. 1 ZC = (9) jwC Uma vez que o capacitor ideal não possui resistência real, o diagrama de Nyquist da resposta de impedância do capacitor mostra apenas uma linha vertical junto à origem do sistema. A resposta de impedância do capacitor pode ser vista na Figura 13. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 28 Figura 13 – Resposta de impedância do capacitor. Fonte: Jorcim, Orazem e Pébère (2006). 2.3.9.4 Circuitos RC Em série, a impedância tem um comportamento aditivo, podendo ser expressa simples- mente como: 1 Z = ZR + ZC = R + (10) jwC Da mesma forma, o diagrama de Nyquist de um circuito RC em série é apenas a soma dos diagramas isolados do resistor e do capacitor: uma reta vertical deslocada da origem do sistema na mesma razão da magnitude da resistência. A Figura 14 mostra o diagrama de Nyquist para um circuito RC em série. Figura 14 – Impedância do circuito RC em série. Fonte: Jorcim, Orazem e Pébère (2006). Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 29 Em paralelo, as admitâncias são aditivas. Assim, o inverso da impedância resultante do circuito RC em paralelo será igual à soma dos inversos da impedância ZR e da impedância ZC . 1 1 = + jwC (11) Z R R Z= (12) 1 + jwRC O diagrama de Nyquist de um circuito RC em paralelo mostrará um semicírculo cortando o eixo real em sua origem e no ponto equivalente à magnitude da resistência R. Isso porque quando a frequência tender ao infinito, o ramo do capacitor se comportará como um curto- circuito, levando toda a corrente a passa por ele e evitar completamente o ramo do resistor (a impedância total será zero). Por outro lado, quando a frequência se aproximar de zero, o ramo do capacitor se comportará como um circuito aberto, de modo que toda corrente fluirá pelo ramo do resistor (a impedância total será puramente resistiva, com o valor da resistência R). A Figura 15 mostra o diagrama de Nyquist de um circuito RC em paralelo. Figura 15 – Impedância do circuito RC em paralelo. Fonte: Adaptado de Jorcim, Orazem e Pébère (2006). 2.3.9.5 O elemento de fase constante e o elemento de Warburg O elemento de fase constante se comporta como um capacitor, porém com uma fase de (-90 x n)o . No diagrama de Nyquist, veremos uma linha reta, porém ela será inclinada e não vertical como a do capacitor (ela será vertical quando n for igual 1). A Figura 16 mostra um exemplo de diagrama de Nyquist para o elemento de fase constante. Quando em paralelo com uma resistência, a resposta no diagrama de Nyquist será um semicírculo que corta o eixo real na origem e na magnitude da resistência R, tal como o circuito RC em paralelo. No entanto, esse não será um semicírculo perfeito. Quando um elemento de fase constante estiver em paralelo com uma resistência, o semicírculo resultante surgirá a partir Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 30 Figura 16 – Resposta de impedância do elemento de fase constante. Fonte: Adaptado de Jorcim, Orazem e Pébère (2006). da tangente da reta do CTE, dando uma impressão de achatamento ao semicírculo. A Figura 17 mostra o Nyquist resultante de um ciruito CTE-R em paralelo. Figura 17 – Impedância do circuito CTE-R em paralelo. Fonte: Adaptado de Jorcim, Orazem e Pébère (2006). O elemento de Warburg se comportará exatamente da mesma forma que o elemento de fase constante, exceto que a reta vista no diagrama de Nyquist sempre estará inclinada em 45o . Assim, percebe-se facilmente pela análise da resposta de impedância destes componentes que quando a frequência varia, variam tanto o componente resistivo quanto o reativo da impedância. A Figura 18 mostra o diagrama de Nyquist para o elemento de Warburg. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 31 Figura 18 – Resposta de impedância do elemento de Warburg. Fonte: Jorcim, Orazem e Pébère (2006). 2.3.9.6 Interpretando a resposta de impedância de um sistema Conhecendo as características das respostas de impedância dos elementos constituentes dos modelos elétricos equivalentes, torna-se possível inferir o modelo a ser aplicado para uma determinada célula eletroquímica apenas observando sua resposta de impedância. Tome-se como exemplo a resposta representada pelo diagrama de Nyquist mostrado na Figura 19. Figura 19 – Resposta de impedância de uma célula eletroquímica. Fonte: Criado pelo autor. À esquerda, um semicírculo corta o eixo real nos pontos Z 0 = 20W e Z 0 = 120W, indicando a presença de uma resistência R1 = 20W em série com um circuito RC (com uma resistência R2 = 100W). No entanto, o achatamento apresentado pelo semicírculo deixa evidente que não se trata de um capacitor, mas sim de um elemento de fase constante. Por fim, a curva termina com uma reta crescente inclinada em 45o , indicando a presença do elemento de Warburg em série Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 32 com a resistência R2 . Fica claro, portanto, que a resposta apresentada neste diagrama de Nyquist corresponde exatamente ao modelo equivalente de Randles, já apresentado na Figura 8. 2.3.10 Linhas de transmissão Finalmente, antes de prosseguirmos para as próximas seções deste trabalho, é importante comentar sobre mais um modelo muitas vezes presente em circuitos elétricos equivalentes. Esse é o modelo das linhas de transmissão. A Figura 20 mostra a interface entre o eletrólito e um eletrodo poroso. Figura 20 – Interface entre o eletrólito e um eletrodo poroso. Fonte: Adaptado de gamry.com. Na Figura 18, vemos a interface ativa entre o eletrólito e um eletrodo de material poroso, assim como as interfaces entre o eletrólito e a base (A) e ponta (B) do eletrodo, respectiva- mente. Porém, como a base do eletrodo e o eletrodo poroso estão conectados eletricamente e normalmente são compostos do material, para fins de simplificação podemos considerar que as interfaces A e B se comportam como o resto da interface ativa. A Figura 21 mostra essas interfaces em termos de blocos correspondentes no modelo elétrico do sistema. Figura 21 – Interface ativa do eletrodo poroso em termos de blocos equivalentes. Fonte: Adaptado de gamry.com. Quando há a presença de um eletrodo poroso, repleto de poros cilíndricos preenchidos com eletrólito, o sistema pode ser modelado como uma grande linha de transmissão. Na Figura 19, os blocos representados por c1 e c2 representam as resistências elétricas intrísecas dos Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 33 materiais do eletrólito e do eletrodo, respectivamente. Os blocos representados por z , por outro lado, representam as capacitâncias de interface existentes em cada poro do eletrodo preenchido de eletrólito. A Figura 22 mostra o circuito elétrico resultante dessa linha. Figura 22 – Circuito equivalente da linha de transmissão. Fonte: Jorcim, Orazem e Pébère (2006). Se considerada infinita, a linha de transmissão resultará em uma resposta de impedância idêntica ao elemento de Warburg, inclusive aparecendo no diagrama de Nyquist como uma reta inclinada em 45o . Assim, a transferência de cargas em uma linha de transmissão se comporta, de certa forma, exatamente como a difusão. Típicos metais que formam o eletrodo negativo em uma bateria são o zinco (Zn), cádmio (Cd), chumbo (Pb) e lítio (Li). O eletrodo positivo é comumente composto de um óxido de manganês (MnO2 ), níquel (NiOOH) ou chumbo (PbO2 ), em um alto estado de valência. Outras opções incluem sulfetos ou halogenetos metálicos, ou mesmo oxigênio ou enxofre elementares, ou halogênios como o bromo (Br2 ). As diferentes possibilidades para os materias ativos que podem ser usados são chamadas de composição da célula eletroquímica. A maioria das baterias usa soluções aquosas de ácidos, álcalis ou sais como eletrólito, porém tal como acontece com os eletrodos, há muitas possibilidades de escolhas de materias para desempenhar esta função. Entre os condutores iônicos que são ou já foram utilizados como eletrólitos estão soluções orgânicas salinas, polímeros, cerâmicas, sais fundidos e até mesmo vidro (KIM et al., 2002). 2.4 Tipos de baterias O sistema mais simples de armazenagem de energia é constiuído de uma única célula eletroquímica, porém este elemento é capaz de armazenar uma limitada quantidade de energia e suprir apenas uma pequena tensão de saída. Para obter uma tensão maior, esse elemento pode ser conectado em série com outros, e para uma maior capacidade, pode ser conectado em paralelo. Em qualquer dos casos, a montagem resultante é denominada uma bateria (CROMPTON, 2000). Os tipos existentes de sistemas de armazenagem eletroquímica de energia variam de acordo com a natureza da reação química, características estruturais e design, refletindo o grande número de aplicações possíveis. Dependendo do princípio de aplicação, baterias podem ser classificadas entre baterias primárias e secundárias. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 34 2.4.1 Baterias primárias Baterias primárias são baterias não-recarregáveis onde a reação eletroquímica é irreversí- vel. Elas contêm uma quantidade definida dos componentes reagentes e podem ser descarregadas apenas uma única vez. Os componentes reagentes são consumidos durante a descarga da bateria, de modo que ela não pode ser usada novamente (CROMPTON, 2000). Apesar desta desvantagem, baterias primárias são uma fonte conveniente de energia para dispositivos eletrônicos portáteis, de comunicação e mais uma grande variedade de outras aplicações. As principais vantagens da bateria primária são sua conveniência, simplicidade, facilidade para usar e a ausência da necessidade de manutenção. Além disso, possuem longa validade, densidade de energia e de potência razoáveis, alta confiabilidade e baixo custo (REDDY, 2011). A Tabela 3 lista as características e aplicações dos principais tipos de baterias primárias. Tabela 3 – Características e aplicações das baterias primárias. Composição Características Aplicações Zinco Carbono (Zn/MnO2 ) Baixo custo, disponível em diversos Lanternas, rádios portáteis, brinque- tamanhos dos, instrumentos Magnésio (Mg/MnO2 ) Alta capacidade, longa vida útil Receptores e transmissores milita- res, transmissores de emergência de aeronaves (EPIRBs) Mercúrio (Zn/HgO) Maior capacidade por volume entre Aparelhos auditivos, marcapassos, os tipos convencionais, tensão cons- fotografia, detectores, equipamento tante de descarga, longa vida útil militar, mas de uso limitado atual- mente devido à utilização do mercú- rio Cádmio (CdHgO) Longa vida útil, boa performance Aplicações especiais sob condições em altas e baixas temperaturas, extremas de temperatura baixa densidade de energia Alcalina (Zn/MnO2 ) Mais popular bateria de uso geral, A bateria primária mais popular que mantém baixa temperatura com alta existe, utilizada nos mais variados taxa de desempenho, baixo custo tipos de aplicações Prata (Zn/Ag2 O) Maior capacidade por peso entre Aparelhos auditivos, fotografia, reló- os tipos convencionais, tensão cons- gios, mísseis, aplicações submarinas tante de descarga, longa vida útil, e espaciais (grande porte) alto custo Zinco-ar (Zn/O2 ) Mais alta densidade de energia, Aplicações especiais, equipamentos baixo custo, dependente das condi- médicos, eletrônicos de uso militar ções atmosféricas Lítio/cátodo solúvel Alta densidade de energia, longa Aplicações que requerem alta densi- vida útil, boa performance através dade de energia, medidores variados, de uma faixa grande de temperatu- eletrônicos militares ras Lítio/cátodo sólido Alta densidade de energia, mantém Aplicações de uso geral que usam baixa temperatura com alta taxa de baterias moeda, câmeras digitais performance, custo competitivo Lítio/eletrólito sólido Vida útil extremamente longa, baixa Equipamentos médicos potência Fonte: Adaptado de (REDDY, 2011) Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 35 2.4.1.1 Baterias de Zinco Carbono A bateria de Zinco Carbono mais comum (também chamada Leclanché) possui um ânodo de zinco e um cátodo de dióxido de manganês, separados por um eletrólito de cloreto de amônio e cloreto de zinco dissolvido em água. Além disso, também costuma-se adicionar carbono em pó (na forma de negro de acetileno) ao cátodo como despolarizador, melhorando a condutividade e retendo a umidade (CROMPTON, 2000). A reação simplificada da célula de Zinco Carbono é a seguinte: Zn + 2MnO2 ! ZnO + Mn2 O3 (13) Em sua configuração cilíndrica convencional, a lata de zinco serve como recipiente e como anodo. O dióxido de manganês é misturado ao negro de acetileno, umedecido com eletrólito, e comprimido até formar uma bobina. Uma haste de carbono é inserida nesta bobina, atuando como coletor de corrente para o eletrodo positivo. A haste de carbono também fornece suporte estrutural e é porosa o bastante para deixar escapar os gases que se formam no interior da célula sem deixar vazar o eletrólito (REDDY, 2011). A Figura 23 mostra os detalhes construtivos da típica célula Leclanché. Figura 23 – Detalhes construtivos da bateria de Zinco Carbono (Leclanché). Fonte: Adaptado de (REDDY, 2011). A bateria de Zinco Carbono foi por muito tempo a mais popular bateria primária para uso geral, porém tem sido substituída pela bateria alcalina em tempos recentes, uma vez que esta apresenta maior capacidade, performance superior e vida útil mais longa. No entanto, em Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 36 muitas aplicações a bateria de Zinco Carbono ainda apresenta uma performance aceitável, e nesses casos pode ser a melhor escolha devido ao seu baixo custo. 2.4.1.2 Baterias Alcalinas A bateria alcalina cilíndrica é constiuída por uma pasta de dióxido de manganês, que faz o papel do cátodo, envolvendo um núcleo central de zinco em pó, que faz a função do ânodo. Entre eles está o eletrólito de hidróxido de potássio. O nome "bateria alcalina"vem do fato do eletrólito de hidróxido de potássio ter um pH básico, ao contrário do eletrólito de cloreto de amônio das baterias Zinco Carbono. A reação básica da bateria alcalina é apresentada a seguir: 1 Zn(s) + MnO2 (s) + H2 O(l) ! MnO(OH)(s) + ZnO(s) (14) 2 A maior condutividade do hidróxido de potássio em relação ao cloreto de amônio possibilitou a adição de grafite altamente condutivo como despolarizador do cátodo. O terminal positivo é formado por uma tampa em contato com o cátodo no topo da bateria, enquanto o terminal negativo é formado por uma haste coletora de corrente conectada à parte de baixo. Todo o conjunto é encapsulado por uma lata de metal, isolada eletricamente do sistema. A Figura 24 mostra os detalhes construtivos de uma bateria alcalina cilíndrica. Figura 24 – Detalhes construtivos da bateria alcalina. Fonte: Adaptado de (REDDY, 2011). Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 37 Este design confere à bateria alcalina uma alta densidade de corrente por unidade de volume dos materiais reagentes utilizados. Também confere à bateria baixas resistência e impedância, e uma capacidade relativamente constante através de uma ampla faixa de correntes de descarga. Por conta de sua alta performance mesmo sob altos drenos de corrente, a bateria alcalina se tornou a bateria mais popular da atualidade (REDDY, 2011). 2.4.1.3 Baterias primárias de Lítio Apesar de não dominarem o mercado de baterias primárias (em grande parte devido ao seu alto custo quando comparado com o custo-benefício alcançado pelos sistemas alcalinos), as baterias primárias de lítio possuem excelente performance e diversas características interessantes. Por conta disso, são usadas nas mais variadas aplicações, e em especial como baterias do tipo moeda para alimentar dispositivos eletrônicos. O lítio possui duas características que o tornam excelente para utilização como pólo negativo em um sistema eletroquímico: é o metal mais leve na tabela periódica (uma caracte- rística muito útil para a manufatura de baterias leves) e possui um alto potencial de redução eletroquímica (3,045V). Em contrapartida, o lítio é altamente reativo com a água, de modo que não pode ser usado com um eletrólito aquoso (CROMPTON, 2000). Por conta disso, diversas alternativas têm sido desenvolvidas, e pode-se dividir as baterias primárias de lítio em 3 grupos gerais: 1. Sistemas com catodos solúveis: células deste tipo usam materiais gasosos ou líquidos como catodo. Assim, o catodo age como solvente do eletrólito, estando dissolvido nele. Nesse tipo de sistema, é necessário que o catodo presente no eletrólito forme uma ca- mada de passivação sobre o anodo de lítio, de modo a prevenir ou desacelerar reações futuras entre os dois (caso contrário, o sistema seria curto-circuitado e a bateria se auto- descarregaria). Exemplos desse tipo de sistema são as baterias de lítio-dióxido sulfúrico (Li/SO2 ) e lítio-cloreto de tionila (Li/SOCl2 ). 2. Sistemas com catodos sólidos: células deste tipo utilizam um material sólido como catodo. Sistemas deste tipo não precisam ser pressurizados e nem de selagem hermética, mas possuem taxa de descarga menor que os sistemas de catodo solúvel. Assim, células de catodo sólido são geralmente projetadas para aplicações de baixo e médio consumo, como dispositivos eletrônicos portáteis. Este é o tipo mais comum de baterias primárias de lítio, sendo a principal delas a bateria de lítio-dióxido de manganês (Li/MnO2 ). 3. Sistemas com eletrodo sólido: células deste tipo utilizam eletrodo de estado sólido, e chumbo ou iodo como catodo. São caracterizadas por possuirem vida útil muito longa (acima de 20 anos) e uma taxa de descarga muito baixa (faixa dos ). Desta forma, este tipo de sistema costuma ser usado apenas em aplicações que requeiram grande tempo de utilização e tenham baixo consumo de corrente (tais como marcapassos e similares). Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 38 Sem dúvidas, a bateria primária de lítio mais comum atualmente é a bateria de lítio- dióxido de manganês. Sistemas de Li/MnO2 possuem longa vida útil, boa performance em baixa temperatura e são capazes de suprir sistemas de consumo moderado. A reação básica da bateria de Li/MnO2 é a seguinte: MnO2 + Li ! MnO2 (Li)+ (15) Apesar dos sistemas de LiMnO2 estarem disponíveis em várias configurações diferentes, o tipo mais comum é a bateria moeda. Nessa connfiguração, o anodo e o catodo são consituídos por discos sólidos de lítio e dióxido de manganês, respectivamente, separados por um separador de polipropileno embebido com eletrólito (normalmente, uma mistura de sais de lítio dissolvidos em um solvente orgânico). O sistema é selado, e a própria lata atual como terinal positivo, enquanto a tampa faz o papel de terminal negativo. A Figura 25 mostra os detalhes construtivos da bateria moeda de LiMnO2 . Figura 25 – Detalhes construtivos da bateria moeda de LiMnO2 . Fonte: Adaptado de (REDDY, 2011). 2.4.2 Baterias secundárias Baterias secundárias são caracterisadas pelo fato das reações que ocorrem dentro da célula eletroquímica serem reversíveis. Isto significa que, quando aplicada uma diferença de potencial entre os terminais da bateria, haverá o fuxo de elétrons no sentido contrário àquele que ocorre espontaneamente, e o anodo e o catodo passarão a desempenhar papéis opostos, com as reações de redução e oxidação ocorrendo inversamente em ambos os eletrodos, e o sistema sendo restaurado ao seu estado original, antes da descarga. Isso equivale a dizer que baterias secundárias podem ser recarregadas com a aplicação de uma diferença de potencial externa entre seus terminais. Baterias secundárias também são chamadas baterias recarregáveis. Capítulo 2. Revisão Bibliográfica 39 Além das características desejáveis normais a todas as baterias (vida útil, capacidade de carga, taxa de descarregamento, etc.), as baterias secundárias possuem ainda outras características de performance importantes, que estão relacionadas com a eficiência dos ciclos de carga e descarga. Durante a carga e descarga de uma bateria secundária, energia elétrica é convertida em energia química e de volta para energia elétrica. Essa conversão deve ocorrer da maneira mais eficiente possível e deve causar o mínimo possível de mudanças físicas no sistema que possam vir a comprometer sua vida útil. A Tabela 4 mostra as características e aplicações dos pricipais tipos de baterias secundárias. Tabela 4 – Características e aplicações das baterias secundárias. Composição Características Aplicações Chumbo-ácido (Automotivas) Extremamente popular, baixo custo, Sistemas de ignição de veículos au- alta taxa de descarga, baixa manu- tomotores tenção Chumbo-ácido (Estacionárias) Longa vida útil, livre de manutenção Sistemas de energia de emergência, alarmes, fontes ininterruptas de ener- gia (UPS) Chumbo-ácido (Portáteis) Seladas, livres de manutenção, Ferramentas portáteis, dispositivos baixo custo, vida útil moderada eletrônicos Níquel-cádmio (Industriais) Alta potência, boa performance em Aeronaves, sistemas industriais e de baixas temperaturas, tensão cons- emergência, sistemas de comunica- tante de descarga, longa vida útil ção Níquel-cádmio (Portáteis) Selada, livre de manutenção, boa Eletrônicos de consumo e dispositi- taxa de descarga em baixa tempe- vos eletrônicos gerais ratura, boa vida útil Níquel-hidreto metálico Selada, livre de manutenção, maior Eletrônicos de consumo, aplicações capacidade que as baterias de níquel- portáteis gerais, veículos elétricos cádmio, alta densidade de energia e híbridos de potência Níquel-ferro Duráveis, construção simples, longa Sistemas de movimentação de mate- vida, baixa energia específica riais, aplicações estacionárias Níquel-zinco Ciclo de vida estendido, alta energia Bicicletas e scooters elétricas, ferra- específica, alta taxa de descarga mentas portáteis Prata-zinco Alta energia específica, excelente Drones, submarinos, aplicações mi- taxa de performance, ciclo de vida litares e aeroespaciais reduzido, alto custo Prata-cádmio Alta energia específica, boa retenção Sistemas portáteis que requeiram ba- de carga, ciclo de vida moderado, terias leves e de alta capacidade, sa- alto custo télites Níquel-hidrogênio Longo ciclo de vida se não houver Aplicações aeroespaciais como saté- discarga constante lites LEO e GEO Íon de lítio Alta energia específica, alta densi- Eletrônicos de consumo, aplicações dade de energia, longo ciclo de vida, portáteis gerais, veículos elétricos, alta taxa de descarga aplicações aeroespaciais Fonte: Adaptado de (REDDY, 2011) 2.4.2.1 Baterias de Níquel Hidreto Metálico No passado, as baterias de níquel-hidreto metálico já foram o tipo mais comum de baterias recarregáveis de uso geral, tomando o lugar que antes era das baterias de níquel-cádmio
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