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Na medida em que todas as obras da UC Digitalis se encontram protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos e demais legislação aplicável, toda a cópia, parcial ou total, deste documento, nos casos em que é legalmente admitida, deverá conter ou fazer-se acompanhar por este aviso. Transparências: linguagem e reflexão de Cícero a Pessoa Autor(es): Ferrer, Diogo Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra URL persistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/43425 DOI: DOI:https://doi.org/10.14195/978-989-26-1481-6 Accessed : 29-Jul-2020 21:44:15 digitalis.uc.pt pombalina.uc.pt TRANSPARÊNCIAS L inguagem e R efLexão de C íCeRo a P essoa DIOGO FERRER IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA COIMBRA UNIVERSITY PRESS Através das lentes da filosofia, da imagem, da literatura ou do mito, os onze estudos neste livro abordam a auto-transparência reflexiva e linguística humanas, na sua relatividade, vir- tualidades e perplexidades. É privilegiado o estudo do pensamento do séc. XX, em especial a Fenomenologia e a Filoso- fia da Linguagem de Husserl, Heidegger e Wittgenstein, remontando-se também a aspectos da Retórica romana (Cícero e Agostinho) e retomando para os debates de hoje elementos estruturantes do pensamento kantiano e do Idealismo Alemão. Especial referência é feita também a figuras determinantes do pensamento português do sec. XX: Fernando Pessoa, José Marinho e Eudoro de Sousa. Num amplo espectro das expressões do seu tema, os textos fazem intervir elementos da literatura, com Borges e Pessoa, das artes visuais, com Escher, e do pensamento arquitetónico no sec. XX. Através de diferentes pensadores e ex- pressões, busca-se assim uma compreensão convergente das condições da auto-refexão linguística, conceptual e imagética do homem. DEIA I I edição I m p r e n s a d a U n i v e r s i d a d e d e C o i m b r a Email: imprensa@uc.pt URL: http//www.uc.pt/imprensa_uc Vendas online: http://livrariadaimprensa.uc.pt direção Maria Luísa Portocarrero Diogo Ferrer conselho científico Alexandre Franco de Sá | Universidade de Coimbra Angelica Nuzzo | City University of New York Birgit Sandkaulen | Ruhr ‑Universität Bochum Christoph Asmuth | Technische Universität Berlin Giuseppe Duso | Università di Padova Jean ‑Christophe Goddard | Université de Toulouse ‑Le Mirail Jephrey Barash | Université de Picardie Jerôme Porée | Université de Rennes José Manuel Martins | Universidade de Évora Karin de Boer | Katholieke Universiteit Leuven Luís Nascimento |Universidade Federal de São Carlos Luís Umbelino | Universidade de Coimbra Marcelino Villaverde | Universidade de Santiago de Compostela Stephen Houlgate | University of Warwick coordenação editorial I m p r e n s a d a U n i v e r s i d a d e d e C o i m b r a c onceção gráfica Imprensa da Universidade de Coimbra P ré ‑ imPressão Bookpaper isBn 978‑989‑26‑1480‑9 isBn d igital 978‑989‑26‑1481‑6 doi https://doi.org/10.14195/978‑989‑26‑1481‑6 © novemBro 2017, i mPrensa da U niversidade de c oimBra DIOGO FERRER IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA COIMBRA UNIVERSITY PRESS TRANSPARÊNCIAS L inguagem e R efLexão de C íCeRo a P essoa (Página deixada propositadamente em branco) À Zajão (Página deixada propositadamente em branco) s U m á r i o Prólogo por Manuel José do Carmo Ferreira .............................................................. 11 Apresentação .................................................................................................... 13 I. Linguagem e Consciência: entre Cícero e Wittgenstein 1. Do Orador ao Mestre: Concepções Romanas da Linguagem ................... 21 1.1. O inconfessado da retórica ................................................................. 23 1.2. A recondução retórica do saber .......................................................... 28 1.3. A pragmática do sinal.......................................................................... 34 1.4. Conclusão ............................................................................................. 37 2. Consciência e Linguagem: Acerca da Crítica Linguística do Sujeito na Primeira Metade do Século XX ..................................................... 39 2.1. Os antecedentes kantianos .................................................................. 40 2.2. Significação e consciência: Husserl e a idealidade das significações........................................................................................... 45 2.3. Wittgenstein e a linguagem dos factos .............................................. 56 2.4. O antecedente etimologista e empirista de Horne Tooke ................ 63 2.5. O pensamento etimológico de Heidegger ......................................... 65 2.6. Sobre o problema da reflexividade em Ser e Tempo : os fundamentos da hermenêutica filosófica ....................................... 71 8 II. Reflexão e Relatividades: de Kant a Borges, via Heidegger 3. Hegel – Escher – Borges: Figuras e Conceitos da Reflexão ...................... 79 3.1. Três formas para um mesmo conteúdo? ............................................ 80 3.2. Borges e Hegel: mundo invertido, filosofia alemã e literatura fantástica ............................................................................... 82 3.3. Escher segundo Hegel: a ontologia da intuição ................................ 84 3.4. A teoria de Escher da consciência de si ............................................. 87 3.5. O sujeito de Escher .............................................................................. 92 3.6. O fim da intuição lá onde não se pode intuir: recuperação da representação .............................................................. 97 3.7. O significado da divisão do plano: mais uma vez Hegel .............. 101 3.8. Objetos impossíveis ........................................................................... 105 3.9. Conclusão: Sistema, negatividade e desenvolvimento ................... 108 4. Pensar e Refletir: Sobre o Modelo Reflexivo do Pensar em Kant e Heidegger ......................................................................................111 4.1. A reflexão lógica................................................................................. 113 4.2. A reflexão transcendental .................................................................. 117 4.3. O juízo reflexivo................................................................................. 125 4.4. A necessidade do pensar ................................................................... 129 4.5. A reflexão da finitude ........................................................................ 132 4.6. Aprender a pensar ............................................................................. 136 4.7. A reflexividade limitada .................................................................... 138 4.8. Aprender a aprender o significado do significado ......................... 142 4.9. Conclusão ........................................................................................... 144 III. Negação e Mitologia no Pensamento Português do Século XX: Pessoa, Marinho e Eudoro 5. Fernando Pessoa e a Consciência Infeliz .................................................. 153 5.1. Negação e consciência ............................................................................. 156 9 5.2. A vivência da dor e a patologia teórica associada .......................... 163 5.3. Do positivo em Pessoa: maturação e desenvolvimento da consciência ..................................................................................... 171 6. Fernando Pessoa: Aproximação Dialética e Fenomenológica ................ 177 6.1. O sistema da poesia pessoana .......................................................... 177 6.2. As figuras do não‑ser pessoano ........................................................ 179 6.3. O laboratório fáustico e a dissolução do real .................................. 181 6.4. As núpcias da diferença .................................................................... 187 6.5. A fábrica dos heterónimos ................................................................ 191 6.6. Conclusão: os modos da diferença em Pessoa ................................ 200 7. Negatividade e Saber Absoluto na Teoria do Ser e da Verdade de José Marinho .............................................................................................. 203 7.1. Sob o signo do negativo .................................................................... 203 7.2. O pré‑predicativo em questão .......................................................... 205 7.3. A palavra e a aurora .......................................................................... 209 7.4. O eixo de simetria reflexivo da Teoria .............................................. 212 7.5. Além da reflexão ................................................................................ 215 7.6. Sobre o saber absoluto ....................................................................... 216 8. Eudoro de Sousa e a Mitologia ................................................................. 219 8.1. Tautegoria, alegoria, significação ..................................................... 220 8.2. O Projeto segundo Eudoro ................................................................ 229 8.3. O achatamento hodierno do símbolo ............................................... 233 IV. Modernidade, Relativismo e Crise 9. Filosofia da Arquitetura e do Espaço: Aproximações Histórico‑Conceptuais ao Modernismo ........................................................ 237 9.1. Sobre a definição da arte ................................................................... 237 9.2. A arquitetura hegeliana ..................................................................... 241 9.3. O fim da arquitetura e mais além .................................................... 245 9.4. Sobre o sentido do modernismo ....................................................... 248 1 0 9.5. Modernismo e modernidade ............................................................ 251 9.6. Modernismo e negação ..................................................................... 252 9.7. Sobre a reação ao modernismo ......................................................... 254 9.8. Final: A ponte como obra de arte ..................................................... 256 10. Sobre os Pressupostos e Consequências da Crítica ao Relativismo nos Prolegómenos à Lógica Pura de Husserl .............................. 261 10.1. A tese da existência de uma forma geral para as fundamentações .................................................................................. 262 10.2. A inteleção, a sua perda e substitutos ............................................ 267 10.3. O relativismo e o ponto de partida reflexivo da fenomenologia ..................................................................................... 270 10.4. Uma crítica aos “argumentos da reflexão” .................................... 275 10.5. Conclusão: Verdade e intencionalidade ......................................... 277 11. A Epoché da Modernidade: A Crise das Ciências Europeias de Husserl ....................................................................................................... 279 11.1. A conceção última da fenomenologia............................................. 279 11.2. O combate pelo significado das palavras ...................................... 281 11.3. A epoché histórica das ciências ........................................................ 282 11.4. O problema filosófico da Modernidade ......................................... 285 11.5. A epoché praxiológica das ciências .................................................. 288 11.6. A ‘Lebenswelt’ e a ampliação final da fenomenologia ................. 292 Origem dos textos .......................................................................................... 297 Referências bibliográficas .............................................................................. 301 Índice onomástico........................................................................................... 311 Índice analítico ............................................................................................... 313 Obras citadas .................................................................................................. 319 P r Ó l o g o A obra Transparências: Linguagem e Reflexão de Cícero a Pessoa é constituída por onze estudos, dos quais nove já foram publicados, mas agora revistos para a presente edição, e dois inéditos; os textos inscrevem‑se no intervalo entre 1997 e 2016, mas a maior parte deles situa‑se no último triénio. Os ensaios estão agrupados em quatro grandes núcleos temá‑ ticos – ‘Linguagem e Consciência’, ‘Conceitos da Reflexão e do Relativismo’, ‘Negação e Mitologia’ e ‘Modernidade, Relativismo e Crise’ e desenrolam‑se num eixo temporal que, privilegiando a con‑ temporaneidade e, nesta, a fenomenologia de Husserl e de Heidegger, bem como a filosofia da linguagem, nomeadamente a de Wittgenstein, remontam à retórica romana (Cícero e Agostinho) e retomam para os debates de hoje elementos estruturantes do pensamento kantiano e do idealismo alemão. Os estudos recuperam ainda para esses mesmos debates figuras determinantes do pensamento português do século xx , Fernando Pessoa, José Marinho e Eudoro de Sousa. Sem nunca se afastar do equacionamento filosófico das questões tratadas, os textos fazem intervir também elementos da literatura, com Borges e Pessoa, e das artes do espaço, com Escher. Confrontados com a diversidade dos temas e dos autores, com o seu complexo entrelaçamento histórico e um dilatado horizonte sistemáti‑ co, importa sublinhar a unidade da obra, uma unidade diferenciante feita de convergências, sem dúvida, mas claramente manifesta logo a partir do intento expresso pelo autor de nos pôr perante diferentes 1 2 capítulos de uma antropologia transcendentalmente assumida e sempre envolvida nas aporias de uma autorreferência sem recuo, de muitos modos tematizada, conceptual e figurativamente, na linguagem do conceito e do símbolo, da poética e da mitologia, pelos pensadores aqui convocados. A uma assinalável unidade formal de uma escrita límpida que exprime um tratamento rigoroso das questões abordadas e que é pontuada por fórmulas fulgurantes de síntese de múltiplos sentidos, acresce a reiterada recondução dessas questões a uma integrativa teoria do sujeito que a linguagem e o pensar estruturam, mas que se explicita num quadro categorial no qual a temporalidade, a verdade e a linguagem são o lugar da emergência do sentido, do sentido do mundo e do sentido de si. Os textos, no seu conjunto, desenham todo um programa de constituição do sujeito como um processo, que é também uma aventura, de passar da auto ‑referência, sempre em questão, a uma auto‑responsabilidade que é a integridade requerida. A que público se destinam estes ensaios, na sua densidade e rique‑ za de perspetivas? Em primeiríssimo lugar, como é óbvio, à gente da filosofia; mas igualmente aos que trabalham nas áreas da linguística e da literatura, da história da cultura, da estética e das artes e, de um modo geral, a todos os interessados na compreensão da genealogia e do sentido da nossa contemporaneidade. Manuel José do Carmo Ferreira a P r e s e n ta ç ã o Este volume reúne textos de diversas linhas teóricas, que con‑ vergem para um foco comum. Uma grande diversidade de fios temáticos conduzem os onze capítulos apresentados em direção a um foco central: o modo como linguagem e reflexão se entrelaçam no pensamento filosófico. A autotransparência reflexiva e linguística do sujeito, nas suas interferências, eclipses, perplexidades e virtua‑ lidades é o foco comum que dá unidade à multiplicidade dos temas estudados. Através das lentes do conceito, da arte, da imagem, da poesia ou do mito, a transparência do sujeito a si mesmo aparece sob diversas colorações que, se mostram os reflexos mais obscuros dessa mesma transparência, são também aquilo que permite que ela seja visível e pensável como tal. Este vasto e muitas vezes difícil questionamento de si do sujeito, em diferentes linguagens e tons da reflexão, está organizado em quatro divisões temáticas. Numa primeira divisão, estudamos o tema da Linguagem e da Consciência . Começa ‑se por investigar um momento ainda inicial na história da Filosofia da Linguagem: as duas principais conceções romanas sobre esta disciplina. A comparação entre estas duas conceções permite diferenciar outras tantas funções e ações fundamentais próprias da linguagem, representadas por dois modelos decisivos para a história do pensamento linguístico‑ ‑filosófico, exemplificados nas duas grandes conceções romanas da Filosofia da Linguagem: as de Cícero e Santo Agostinho. Estas concepções traduzem os modelos de uso da linguagem estabelecidos 1 4 pelas duas personagens conceptuais do Orador e do Mestre. Estes modelos, por sua vez, criam uma diferença que será doravante essencial ao conceito do sujeito, nomeadamente a sua estruturação historicamente constituída entre a exterioridade da prática social e a interioridade da mente. Como segundo capítulo do estudo da Linguagem e da Consciência, são expostas questões similares, mas agora sob uma aparelhagem conceptual muito diferente e renovada, no século xx . A crítica lin‑ guística do sujeito é articulada, no segundo Capítulo, partindo de I. Kant, centrando‑se o nosso estudo em seguida especialmente nos con‑ tributos de E. Husserl, L. Wittgenstein e M. Heidegger. Wittgenstein e Heidegger, contra a integral autotransparência monológica e in‑ terior do sujeito a si próprio, e do sentido, defendida por Husserl, convergem na conclusão da impossibilidade de uma transparência do sujeito a si, por força do modo como o define a sua constituição linguística, só limitadamente reflexiva. O acesso ao sentido é feito sempre a partir de uma fonte não autorreferente, e descentrada da consciência de si. A segunda divisão da obra aborda o tema da Reflexão e Relatividades São aqui estudadas as perspetivas estética e concetual da reflexão pela qual o eu representa e se autorrepresenta. Isto é feito, no Capítulo 3, pelo estudo do tratamento estético do espaço e de outros elementos constitutivos da representação visual e ficcional do mundo em M. C. Escher e J. L. Borges, e da sua surpreendente congenialidade com a abordagem concetual de G. W. F. Hegel acerca dos mesmos temas. Como quarto Capítulo, partindo mais uma vez de uma leitura de Kant, será oposto o modelo reflexivo da geração e definição do sen‑ tido, eminentemente transcendental e autorreferente, ao modelo do pensar rememorativo e etimológico heideggeriano, entendidos como dois modos – concorrentes, mas também inevitavelmente comple‑ mentares – da transparência de si do sujeito e da constituição da sua experiência. Distinguem‑se, assim, dois modelos para compreender 1 5 como o sentido do ser transparece na experiência: o modelo reflexivo kantiano e o modelo memorial‑etimológico heideggeriano. Na terceira parte, dedicada à Mitologia do Eu e Negatividade no Pensamento Português do Século XX , o acesso do sujeito a si mesmo, nas suas vertentes simbólica e estética, é estudado em três momentos: Fernando Pessoa, José Marinho e Eudoro de Sousa. O problema do estatuto do eu e da linguagem, com as suas transformações estéticas e mitológicas, é aqui aprofundado com recurso a um conceito central para a definição do eu, do seu acesso a si e da sua relação com o mun‑ do: o conceito da negação. A negação, enquanto condição da posição do eu define, através de diversas configurações, aspetos essenciais do pensamento pessoano e mariniano, nos Capítulos 5, 6 e 7. Com Eudoro de Sousa se mostram em seguida, no Capítulo 8, dimensões insuspeitadas da relação a si, onde o homem não pode deixar de se situar, entre as potências históricas e antropológicas da razão e do mito. Como quarta e final divisão temática, sob o título da Modernidade, Relativismo e Crise estuda‑se a questão do relativismo que frequenta criticamente o sujeito, procurando compreender os motivos teóricos do corte da sua relação referencial objetiva com o mundo, já implícita em diversos momentos do percurso anterior. Abre esta secção, no Capítulo 9, o estudo do modernismo arquitetónico como linguagem da reflexão e algumas das linhas de força da sua superação ou renovação no pensamento estético sobre a arquitetura. Encontra‑se na Estética de Hegel a inauguração de uma conceção semântica da arquitetura, seguindo‑se o estudo da constituição e das condições teóricas da lin‑ guagem arquitetónica, onde se impõem referências a Le Corbusier ou novamente a Wittgenstein, até à crítica ao modernismo em Heidegger ou M. Cacciari. Nesta secção, dedicada ao moderno, ao relativismo e à crise de sentido, são estudados em seguida os dois extremos his‑ tóricos da obra fenomenológica de Edmund Husserl: os Prolegómenos à Lógica Pura , de 1900, e a Crise das Ciências Europeias , de 1935. Estas são as obras que, cronologicamente, representam a abertura e o fecho, 1 6 as condições primeiras de sentido e as possibilidades últimas e mais concretas do trajeto fenomenológico de Husserl. São apresentados e explorados, primeiramente, no Capítulo 10, os argumentos críticos da fenomenologia husserliana contra o psicologismo, que obscurece o sentido original da doação do mundo e do acesso que temos a nós mesmos. Finalmente, no Capítulo 11, procura‑se mostrar de que modo o assumir pleno das relatividades percetuais, somáticas, intersubje‑ tivas e, finalmente, históricas e culturais, pelas quais o eu acede a si e ao mundo, não põe em causa, mas antes amplia, o projeto fenome‑ nológico de Husserl. Como Husserl mostra, mesmo as relatividades aparentemente mais inamovíveis da experiência no mundo da vida são objeto de redução fenomenológica e recondução a um plano de sentido mais fundamental. Tornam ‑se, então, mais uma vez claras as duas grandes vertentes críticas e construtivas do pensamento de Husserl: antirrelativista e antirreducionista, numa contracorrente aos movimentos dominantes no século xx Apesar da diversidade temática, este conjunto de estudos obedece a uma preocupação filosófica coerente, em que a questão sempre re‑ novada é a do homem e do problema da sua relação consigo mesmo através da inevitabilidade da sua reflexão, tanto na experiência da linguagem quando na do mundo, acompanhando pensadores que se exprimem filosoficamente quer pelo conceito, quer pela imagem, a poesia, o mito ou a ficção. A maior parte dos capítulos corresponde a artigos publicados anteriormente em diferentes locais, que sofreram algumas alterações e correções para esta publicação em livro, de modo a suprir as insufi‑ ciências mais facilmente corrigíveis. Mantêm‑se, no entanto, as marcas de terem sido escritos em tempos e sob o signo de preocupações teó‑ ricas bastante diferentes. Renunciei a alterações mais profundas, que corresponderiam a escrever um outro livro sobre os mesmos temas. Agradeço ao Prof. Doutor Carmo Ferreira o Prólogo com que honrou este volume, ao Prof. Doutor José Manuel Martins a sua 1 7 leitura e inteligência filosófica, e aos editores das publicações ori‑ ginais, cuja lista se apresenta no fim do volume, pela autorização para esta publicação na Coleção Ideia da Imprensa da Universidade de Coimbra.